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Reflexões sobre a Semana Santa de São João del-Rei . André Guilherme Dornelles Dangelo
Descrição
A bruma da manhã já anuncia um tempo de outono na velha São João del-Rei. É a época da tradicional Semana Santa.
O relógio da Matriz acaba de bater 6 horas.
Em casa refletindo sobre o meu intenso dia de ontem, gravando no Carmo e na Matriz os conteúdos do "Mapa do Patrimônio" para o Museu dos Sinos, muita coisa me vem a memória, acho que fruto da minha visita a Matriz e a torre do Santíssimo. Todo aquele ambiente, foi uma segunda casa para mim durante muitos anos da minha vida de menino e adolescente. O que explica muito dos motivos da minha opção por fazer um livro definitivo sobre a história da Matriz do Pilar a ser lançado em Agosto próximo, comemorando os 300 anos da sua fundação.
Nestes tempos de Semana Santa, a cidade ainda parece carregar o peso do século do Barroco. Parece que existe a expectativa no ar da sua grande celebração. Antigamente também chamada com a deferência de "Semana Maior" em toda antiga região das Minas.
Vendo ontem a grande movimentação para a preparação nas igrejas para as Solenidades da Semana Santa, acabei me vendo rodeado de fantasmas e de saudades.
Talvez se subisse ao velho Tabernáculo encontrasse minha madrinha, suas ajudantes e meu primo Luiz Dangelo , conferindo e arrumando os últimos detalhes das roupas dos figurados para a procissão de Sexta-feira.
Aloizio Viegas vistoriando toda a prataria e as coisas do Cerimoniário utilizados nessa Liturgia tão especial.
Na Sacristia, encontraria seu Geraldo " meu chefe" , João Sacristão ( esse ainda vivo) conferindo os paramentos. O lendário seu Borges arrumando as velas e separando o incenso. Atrás da Igreja, tio Waldemar, Henrique Fernandes , João Pato e Júlio Vieira começando a preparar a montagem do palco das Cerimônias do Lava-pés. Monsenhor Paiva , já de batina preta, no seu passo rápido demostrando ansiedade, andando de um lado para o outro para conferir o trabalho de todos.
A rapaziada da torre já estava toda por ali, esperando o Ely sineiro chegar pra abrir a torre para começar a faxina e aguardando ansiosamente a quarta-feira. Também se desdobrando no trabalho de buscar as plantas que iriam enfeitar a Capela do Santíssimo para a cerimónia de Quinta-feira. Naquele tempo só se compravam as flores.
Na Irmandade dos Passos, seu João Araújo, seu Antônio Eloy ,com ajuda do pessoal da Prefeitura, Luiz Otávio e o Dadinho e outros irmãos, ja estariam montando o Passinho do Encontro. Zé Maria Neves e Stela Neves passando pra conferir o número de cadeiras da orquestra para o Ofício de Trevas.
A rápida visita que fiz a casa das minhas Tias no Largo das Mercês, me deu a sensação que meus avós e outros parentes estivessem na casa. Era questão de esperar e eles chegariam. Acho que é por tudo isso que Sexta-feira ainda carrego a Lanterna na procissão de enterro. Não é uma questão de vaidade como muitos julgam. E de pertencimento e identidade com isso tudo, como também e certamente o caso de muita gente que lá está. Muita gente não entende o que é isso.
Trabalhar com memória, é algo ao mesmo tempo confortante e desgastante, e você não
precisa acreditar no espiritismo para viver e conviver com os mortos.
Eles por conta própria já habitam dentro de você... certamente Marcel Proust explicaria melhor isso.
abril de 2022