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Carta do Amanhã: por um Brasil digno de ser sonhado
Instituto Vertentes | Educação com Impacto Social | Tiradentes
O que leva, há 3 anos, mulheres e homens de diferentes regiões, de diferentes gerações, de diferentes profissões a se encontrarem no Fórum do Amanhã, na histórica cidade de Tiradentes, para pensar o Brasil?
Uma resposta é comum a todos e a todas: a vontade de contribuir, de alguma forma, para que este país, tão cantado em verso e prosa, vença suas enormes dificuldades, que nasceram lá atrás e são as nossas raízes com cicatrizes ainda abertas.
Mesmo diante da crise profunda que atravessamos, o Brasil tem como escolher um futuro próspero e digno para todos. Não estamos condenados a um futuro medíocre. A dimensão do exequível e do provável não estão dadas de uma vez por todas, depende muito da
intensidade de nosso querer. Obstáculos podem se transformar em oportunidades de conquista e avanço, de novidade, de sonho e criação.
Construiremos um novo amanhã ao estabelecer diálogos que superem as polarizações e ampliem nossa capacidade de reconhecer o outro, aquele que é diferente de nós, como legítimo. Talvez a hora seja esta de nos perguntarmos: existe um sonho compartilhado brasileiro? Como superar as cicatrizes do passado e construir um país que manifeste seu protagonismo no mundo? O que pode nos unir?
1. O que pode nos unir são nossas riquezas.
Desconhecemos, enquanto nação, o imenso valor das riquezas que temos à nossa disposição. E por isso não as protegemos nem distribuímos, nos tornando assim um país desigual e cindido. É preciso olhar para nosso potencial enquanto país com novos olhos. Reconhecer, proteger e compartilhar nossas imensas riquezas materiais e imateriais, naturais e sociais pode ser um poderoso fator de união nacional.
Qual é o ponto de partida para que isso aconteça?
Em primeiro lugar, a superação de nosso complexo de vira-lata, de que falava Nelson Rodrigues, reconhecendo nossas origens comuns e valorizando a mestiçagem que nos torna únicos no mundo, mais resilientes, flexíveis e, portanto, melhor preparados para as mudanças radicais de nosso tempo.
2. Como melhor distribuir
Não se pode falar em riquezas brasileiras sem reconhecer as desigualdades que nos caracterizam. Ainda não atendemos às demandas mais elementares de vida de grande parte de nossa população, em especial nas áreas de saúde, segurança, educação, renda e saneamento básico.
Compreender que a redistribuição é um benefício para todos significa propor uma inversão profunda de valores: priorizar a cooperação, o compartilhamento, a solidariedade e o sentido de comunidade, em detrimento da competição, da acumulação, do individualismo e do patrimonialismo. Para isso, é necessário que se estabeleça um novo pacto pela redistribuição da riqueza, do trabalho, do poder, das oportunidades, do saber.
3. Valorizar nossos tesouros naturais
Ainda não temos plena consciência, enquanto povo, do valor de nossa biodiversidade.
Não realizamos a ideia de que o Brasil é gigante pela própria natureza, como está em nosso hino, de modo a protegermos nossas florestas e montanhas, nossos rios e costas marinhas, nossa fauna e flora. Desconhecemos os benefícios presentes e futuros de nosso inestimável patrimônio natural
Prevalece no país a mentalidade de que a proteção ambiental é um entrave ao desenvolvimento, mas são justamente as riquezas naturais, conjugadas à revolução das tecnologias, que podem criar as condições para que o país encontre o seu potencial energético, econômico e criativo. O Brasil tem condições de tornar-se partícipe de um comportamento responsável no mundo.
4. Educação como prioridade
Quem nos olha de fora admira nossa criatividade, que se expressa na música,
nas festas populares, na forma com que nos adaptamos às mudanças e às dificuldades, no nosso famoso “jeitinho”, nas inventivas e muitas soluções que as comunidades criam para se superar, se reinventar e dar a volta por cima.
Mas é preciso transformar criatividade em inovação, em práticas geradoras de benefícios sociais e econômicos com impacto de larga escala. Inovação exige capacidade de agregar informação, conhecimento e inteligência aos processos produtivos. E este é um grande obstáculo para a nossa educação, com décadas de agendas políticas imediatistas.
No entanto, priorizar a educação sem uma visão arrojada de futuro é um esforço inócuo. Precisamos de um projeto de nação.
As políticas públicas de educação devem ser parte de uma tessitura mais ampla de práticas que superem os valores atuais nos campos da cultura, da saúde, da economia e do desenvolvimento social. Um enredo que requer um projeto comum de futuro para ser empreendido.
5. Cuidar da vida onde ela acontece
É no território onde vive que cada cidadão pode contribuir, individual e coletivamente, para um futuro melhor.
Grande parte das políticas públicas de ocupação do espaço urbano, que comporta hoje mais de 80% da população, promovem a periferização da moradia, a carência de mobilidade, a ineficiência de saneamento e o aprofundamento da segregação socioespacial. Está ao nosso alcance redesenhar as cidades com a criação de locais seguros de convivência entre os diferentes. Construir os valores que vão trazer de volta a noção de bem público como responsabilidade de todos.
Enquanto isso, no campo, é preciso valorizar as inúmeras soluções já em curso de desenvolvimento local, que possibilitam a agricultura familiar e empresarial, práticas produtivas que preservam as florestas, e o crescimento da oferta e consumo de alimentos orgânicos. São caminhos complementares que contribuem para a qualidade de vida de todos.
6. Desenvolvimento é ir além do crescimento econômico.
Nossa ideia de riqueza não pode ser medida pelo PIB per capita, que ignora bens intangíveis como a valorização das relações interpessoais, a afetividade, o dom de celebrar a vida, a musicalidade e tantos outros aspectos de nosso repertório cultural e espiritual.
Novos critérios de desenvolvimento requerem a integração entre o novo e o velho, a ação e a reflexão, o material e o imaterial, as mudanças individuais e as coletivas, a força das raízes e as virtudes da civilização, o trabalho e o prazer, a ciência e a sabedoria ancestral.
É importante que nossas políticas públicas tenham como base os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODSs), que propõem novas métricas de produção, consumo e crescimento econômico para um futuro ambiental e socialmente sustentável.
7. Fortalecer a Renovação da Política
A esperança de renovação do cenário político brasileiro está nos milhares de cidadãos, em especial jovens, engajados nos diversos movimentos que têm criado novas maneiras ser e fazer a democracia.
Apesar dos diferentes matizes ideológicos e da grande diversidade das causas defendidas, uma nova geração se organiza a partir da indignação com o fisiologismo, a corrupção e a ineficiência, que são a marca das velhas formas de se fazer política, e que não respondem mais aos anseios da maioria dos brasileiros.
Agora, mais do que nunca, em uma sociedade fragmentada, a renovação da política terá o desafio de reafirmar a democracia como valor absoluto e unir os brasileiros em causas que superem as polarizações. O Estado apenas estará a serviço da sociedade quando a participação cidadã de qualidade fizer juz ao primeiro artigo de nossa constituição, que diz “todo o poder emana do povo”.
8. É hora de apostar em um novo Sonho
O Brasil digno de ser sonhado nasce em cada um de nós, espalha-se por nossas ações e relações, manifesta-se silenciosamente em nossas vidas, até o dia em que se revelará como uma escolha possível e desejável a todos os brasileiros.
Não nos faltam bons exemplos em todo o país de como já estamos reinventando nosso viver nas cidades, nas periferias, nas práticas agrícolas, dentro das empresas e também nas famílias.
Mas não podemos nos iludir com ações isoladas. É preciso transformar estas práticas em conjuntos mais amplos, numa espécie de mosaico de um novo país. O caminho possível é aquele em que cada um de nós se posiciona como uma peça singular a serviço de um país que nosso sonhar conjunto nos permite imaginar e criar.
Fonte: Fórum do Amanhã | Tiradentes