São João del-Rei, Tiradentes e Ouro Preto Transparentes

a cidade com que sonhamos é a cidade que podemos construir

la ciudad que soñamos es la ciudad que podemos construir

the city we dream of is the one we can build ourselves

la cittá che sognamo é la cittá che possiamo costruire

la ville dont on rêve c’est celle que nous pouvons construire

ser nobre é ter identidade
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Publicações

Tipo: Artigos | Cartilhas | Livros | Teses e Monografias | Pesquisas | Lideranças e Mecenas | Diversos

Escopo: São João del-Rei | Tiradentes | Ouro Preto | Minas Gerais | Brasil | Mundo

 

José Pancetti

Descrição

José Pancetti (Campinas, 18 de junho de 1902 — Rio de Janeiro, 10 de fevereiro de 1958) foi um pintor modernista brasileiro. Considerado um dos grandes paisagistas da pintura nacional.
Nascido numa família humilde de imigrantes da Toscana, viveu em Campinas até os oito anos, quando seu pai, mestre de obras, mudou-se com a mulher e filhos para a capital paulista, onde esperava encontrar melhores condições de trabalho. Aos onze anos, José Pancetti e uma de suas irmãs são levados para a Itália para viver sob os cuidados de um tio e dos avós.
Chegando à casa do tio Casimiro, é colocado para estudar no Cólégio Salesiano de Massa-Carrara. Mas pouco tempo depois, o país seria envolvido na Primeira Guerra Mundial e Pancetti vai para o campo, na casa de seus avós, na localidade de Pietrasanta.
Não se adapta à vida de camponês , exercendo diversas ocupações desde aprendiz de carpinteiro, operário na fábrica de bicicletas Bianchi e empregado numa fábrica de materiais bélicos em Forte dei Marmi.
Para fixá-lo num ofício mais atrente, seu tio emprega-o na marinha mercante italiana onde deveria aprender a profissão de marinheiro. Embarca no veleiro Maria Rosa que percorria o Mediterrâneo, principalmente entre os portos de Gênova e Alexandria. Mas a inconstância própria de seu carater faz com que abandone o navio e passe a vagar pelas ruas de Gênova, com sérias dificuldades de subsistência. Até que num determinado dia, alguém o encaminha para o consulado brasileiro, onde é providenciado o seu repatriamento.
Voltando ao Brasil, no dia 12 de fevereiro de 1920, desembarca em Santos. Para sobreviver trabalha em diversos lugares e ofícios diferentes até que, em 1921, transfere-se para São Paulo onde um empresário, também italiano, lhe dá um emprego de pintor de paredes e cartazes. Parece ter sido este o seu primeiro contato com tintas.
Naquele mesmo ano, o pintor Adolfo Fonzari oferece a Pancetti uma oportunidade de auxiliá-lo na decoração da casa do comendador Pugliese na cidade litorânea do Guarujá.
Em seguida, no ano de 1922, consegue alistar-se na Marinha de Guerra do Brasil, onde permanecerá até 1946.
A bordo foi-lhe dada a tarefa de pintar cascos, paredes, camarotes e o fazia com tal zêlo que sua fama correu pela Marinha, até que um almirante criou um quadro de especialistas na profissão e nomeou Pancetti primeiro instrutor desse quadro. Mas ser pintor de paredes tornou-se aborrecido e no marinheiro começou a nascer a vontade de passar para o papel aquilo que seus olhos viam. E assim passou a desenhar, em data que nem mesmo ele soube precisar, pequenos cartões com paisagens, marinhas, cenas românticas ainda bastante primárias mas que já mostravam seu potencial artístico.
Em 1932 tem sua primeira marinha publicada no jornal “A Noite Ilustrada”, sob o título, "Um Amador da Pintura". Ao ver seu desenho o escultor Paulo Mazzuchelli, aconselha-o a ingressar no Núcleo Bernardelli.
Acatando a sugestão, ingressa Pancetti no Núcleo Bernardelli onde teve como principal orientador o pintor Bruno Lechowski.
Dois anos depois, em 1935, casa-se com Annita Caruso. Em 1941, seu quadro "O Chão" ganha o prêmio de viagem ao estrangeiro, na recém criada Divisão Moderna do Salão Nacional de Belas Artes. Por motivos de saúde é reformado em 1942 e tem seu prêmio transformado em auxílio, morando em Campos do Jordão e, em 1945, em São João del-Rei para tratar-se. Nasce sua filha Nilma.
Sua primeira exposição individual ocorre em 1945, apresentando mais de setenta quadros, e em 1948 recebe a medalha de ouro do Salão Nacional de Belas Artes. Já sua primeira exposição internacional tem lugar em 1950, na Bienal de Veneza, no ano seguinte, 1951, é presença garantida na primeira Bienal Internacional de Arte de São Paulo. Em 1952 é promovido a primeiro-tentente e nasce seu filho Luis Carlos. No ano seguinte, 1953 participa da II Bienal de São Paulo e em 1955 realiza importante exposição no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro.
Em 1958 morre com câncer no hospital da Marinha no Rio de Janeiro e é enterrado no cemitério São João Batista da capital fluminense, tendo o poeta Augusto Frederico Schmidt proferido a oração fúnebre.

Exposição Coletiva São João del-Rei de Pancetti

Fonte: Wikipédia

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Pancetti, o livro e o coração . José Roberto Teixeira Leite

Galeria Virtual . Pancetti . Obras em São João del-Rei

Num de seus auto-retratos mais famosos, Auto-Vida, José Pancetti representou-se com uniforme de marinheiro, no chapéu a fita do "Rio Grande do Norte", ao ombro as três lis­tras vermelhas de primeiro sargento e sustentando com a mão direita erguida à altura do peito um livro de arte. Embora fruto, como qualquer auto-retrato de judiciosa observação, é ao mesmo tempo obra nostálgica e imaginosa, primeiro porque ao ser pintada, em 1945, havia quatro anos Pancetti não mais estava no serviço ativo da Marinha, e depois porque, ao que conste, nunca serviu na referida belonave. Isso, porém torna-se apenas um detalhe quando se observa como, nesse óleo de densidade psicológica excepcional, que ele próprio considerava uma de suas melhores obras, o grande pintor soube sintetizar os dois pólos em que se bifurcava sua personalidade - o marinheiro e o artista -, os quais coe­xistiram e se complementaram sem que um jamais sufocasse o outro.

Cabe indagar o porque das muitas dezenas de auto-retratos pintados por Pancetti, quan­tidade que, aliada à altíssima qualidade, transformam-no, ao lado de Eliseu Visconti, no artista brasileiro mais importante do gênero: não terá sido decerto por mera vaidade, nem pela vontade de, como Fausto, deter o momento que passa; muito menos por falta de mo­delos, ele que os teve às dúzias: tratava -se, isso sim, de uma obstinada busca pelo próprio eu, de um mergulhar incessante nas mais recônditas regiões do ser, do sutil diálogo entre pintor e sua alma materializada em rostos, vestes, posturas. Foi assim, debruçado sobre cais de si mesmo, que esse artista enriqueceu a pintura brasileira com uma série de obras admiráveis, representando-se como marinheiro ou como sacerdote, aqui como pai de família, ali como pintor, às vezes como agitador social e de outras como trabalhador rural, ora como grevista ora como almirante ou vagabundo de praia, até mesmo sob as negras vestes de deão de Canterbury!

Mas o detalhe de Auto-Vida que merece maior atenção é o livro que Pancetti segura junto ao peito e que por assim dizer serve de âncora a toda a composição - Ismos, do grande escritor Ramón Gómez de Ia Serna, figura seminal da vanguarda espanhola dos anos 20: pu­blicada em 1931 em Madrid essa obra passa em revista, desde o ponto de vista personalíssimo do inventor das greguerias, os 25 ismos por ele considerados os mais significativos da arte de seu tempo, entre eles futurismo, simultaneismo, dadaísmo, picassismo, lhotismo, archipenkismo, riverismo, negrismo, monstruosismo e, com destaque especial, humorismo, pois o humor funcionou como leitor motivo de toda a enorme produção ramoniana.

Essa grande confusão de ismos à disposição de Pancetti nas páginas de um livro, cada qual a lhe apontar um caminho, podia ser responsabilizada pela expressão desconfiada e pelo olhar atônito do pintor, se essa mesma expressão e esse mesmíssimo olhar não estivessem presentes em praticamente todos os auto-retratos que produziu ao longo da carreira. Ora, levando-se em conta o fato de que Pancetti nunca foi dado a grandes leituras (sua sabedo­ria, como a de Portinari ou Guignard, era exclusivamente a pictórica, adquirida na prática e não em livros), pode-se concluir que a inclusão de Ismos na composição apenas serviu a Pancetti como ingrediente simbólico a sublinhar sua condição de artista, um artista com­prometido com seu próprio tempo. Por outro lado, o título Auto-Vida dado à pintura revela como, para Pancetti, arte e vida eram uma coisa só, ele que poderia te dito, parodiando Walt Whitman: Camaradas, isso não é uma pintura, quem a toca está tocando um homem.

E já que falamos num grande poeta, e como os poetas costumam atinar sem rodeios e por intuição com aquilo que críticos e estudiosos só conseguem conceituar após complicadas elucubrações mentais, diremos que foi Pablo Neruda quem melhor parece ter compreen­dido Pancetti, ao defini-lo como um gran pintor de corazón puro. De fato, em suas mari­nhas e paisagens, figuras ou naturezas-mortas sobra pouco espaço para teorias e raciona­lizações: nelas tudo é transparente como água do mar que se toma entre as mãos. Essa sim­plicidade, o despojamento ascético da pintura de Pancetti (que iriam transformá-lo num dos pintores mais populares de seu tempo), explicam porque não aderiu ao Abstracionismo, num momento, os anos iniciais da década de 1950, em que, sob o impacto da recém-criada Bienal de São Paulo, tornou-se quase obrigatório fazê-lo - a menos que se queira ver, nas roupas multicoloridas espalhadas pela areia junto à lagoa, nos lindos quadros da série das Lavadeiras de Abaeté, um tímido e passageiro flerte com o não-figurativismo.

Pintor de corazón puro... Só a singela definição de Arte com que Pancetti inicia um cader­no de notas (sem falar na profunda admiração que tinha pelos versos de Casemiro de Abreu) basta para atestar essa pureza de coração:

- Qualquer representação da vida deve ser real. O que é arte? A arte é a representação da vida através de instrumentos criados pelo homem. O que é o homem? A vida. Portanto, escrever, compor, esculpir ou pintar deve ser exatamente aquilo que representa esse mesmo homem, isso é, o real.

Graças a Deus Pancetti nunca seguiu ao pé da letra suas próprias concepções estéticas e realista não foi, apesar de a realidade lhe ter servido sempre como ponto de apoio ou referência, partitura que amorosamente interpretou e da qual, porque pintava com o coração, soube apartar-se quando a emoção assim julgou necessário. Amor e emoção são aliás vocábulos recorrentes sempre que se fala na pintura de Pancetti, o qual em certa ocasião chegou a confessar:

- Tudo o que pinto é com amor. Só sei pintar com amor.

Amor que para ele não significava transbordamentos ou sentimentalismo, já que a orga­nização estrutural que sabiamente imprimiu a seus quadros revela preocupações de ordem racional capazes de impedir excessos sem asfixiar a emoção. Isso se pode constatar de forma mais nítida em certos retratos de crianças e de doentes mentais (pelos quais num dado momento da vida demonstrou estranho fascínio), ou nas naturezas-mortas com­pósitas, nas quais pioneiramente combinou naturezas-mortas propriamente ditas a inte­riores, marinhas, retratos e auto-retratos, tudo interligado por complexos vínculos de conotação simbólica. Nos retratos de loucos e de enfermos, sobretudo, sua arte atinge dramaticidade e pungência sem paralelos na pintura moderna brasileira, a não ser quem sabe em algumas das pinturas mais patéticas de Segall.

Característica que não pode deixar de ser destacada e que não possui similar na obra de qualquer outro pintor brasileiro é que Pancetti costumava grafar no dorso de seus quadros não apenas assinaturas, datas ou dedicatórias como também desabafos sentimentais ou confessionais, frases do quotidiano, trechos de poemas, nomes de musas e signos pecu­liares que, formando uma curiosa autobiografia, permitem-nos hoje recuperar detalhes de outro modo inacessíveis de sua carreira e personalidade, e que em certos momentos chegam a servir de complemento à pintura da frente. Assim, no dorso de um óleo pintado em 1945 em São João Del Rey (aliás, incluído na presente exposição) pode-se ler: "Ontem foi domingo morreu Mário de Andrade. Estou de luto, estamos de luto" - sentimento de perda e melancolia que reitera a solidão daquela figura de menino sentado a um canto de rua enigmático como uma encruzilhada, e que em última análise é Pancetti ele mesmo. Tendo vivido apenas 55 anos e criado, no decurso de uma carreira de pouco mais de 30, uma obra que há de permanecer entre o que de mais valioso produziu a arte brasileira de todos os tempos, Pancetti é o grande romântico do Modernismo brasileiro, como o ates­tam suas marinhas, nas quais mar, céu e areia adquirem status de símbolo existencial, as paisagens de corte tão original, os auto-retratos e retratos, inclusive as tão mais racionais naturezas-mortas. A presente exposição*, que pela primeira vez traz a Ribeirão Preto e à sua cidade natal de Campinas importante seleção de algumas de suas pinturas mais signi­ficativas' comemora com orgulho o centenário do seu nascimento.

Centenário de seu nascimento, escrevemos? - Pancetti, vaidoso como sempre, decerto nos corrigiria, dizendo que ainda faltam alguns anos.

Fonte:
Catálogo da Exposição* 100 anos de Pancetti
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