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Rara coleção do jornal da Biblioteca Baptista Caetano d’Almeida, em São João d'el Rei precisa de cuidados . Wilson Coutinho
Descrição
Salvem ‘Le moniteur universel’ . Em São João del-Rei, uma rara coleção do jornal da Revolução Francesa precisa de cuidados
Wilson Coutinho
A Biblioteca Baptista Caetano d’Almeida, em São João d’el Rei, guarda uma relíquia em suas estantes, coleção única no Brasil e raríssima no mundo. Trata-se das edições do jornal Le moniteur universel – o órgão oficial da Revolução Francesa, ou melhor, da República. O acervo foi parar em Minas Gerais quando o fundador da biblioteca, Baptista Caetano, o adquiriu, em 1827, num leilão no Rio de Janeiro. Desconhece-se ainda quem foi seu proprietário original e como a valiosa coleção do jornal revolucionário veio parar no Brasil.
Lendas rondam São João d’el Rei, que como todas as cidades históricas mineiras têm prazer de cultivá-las. Conta-se que os jornais pertenciam aos inconfidentes ou que estudantes, em Coimbra ou Paris, os traziam escondidos como aríetes literários da subversão. Lendas boas de ouvir e que servem para puxar a imaginação. Imagine Bárbara Heliodora, mulher do inconfidente Alvarenga Peixoto, folheando as suas páginas, atrás de notícias sobre a Assembléia, ou lendo o processo que condenou Maria Antonieta.
Que as lendas vivam, mas o fato é que os jornais chegaram em São João d’el Rei no século passado. Le moniteur foi criado em 5 de maio de 1789 por Charles Joseph Packoucke, o célebre editor de Voltaire, e proprietário de Le Mercure de France. Foi transformado em diário em 24 de novembro, cuja primeira edição pode ser encontrada na Biblioteca Baptista Caetano d’Almeida.
O editorial não é, ao contrário dos panfletos da época, incendiário. Chama a atenção seu tom equilibrado, a proposta de publica seu noticiário com “exatidão pelos fatos, fidelidade escrupulosa na transcrição dos decretos”. Baseado nesses critérios, o jornal manteve-se, seguiu todas as marchas e contramarchas do período revolucionário e só fechou em 1901. Hoje é um documento de raro valor.
Historiadores franceses, quando visitam a biblioteca, ficam admirados em encontrar um tal monumento no Brasil. Mas há problemas. Apesar do esforço da Prefeitura e do carinho das bibliotecárias, a coleção luta contra traças, precisa de um local mais apropriado para ser guardada e necessita de trabalho de técnicos especializados para preservá-la antes que seja tarde demais.
É preciso salvar Le moniteur por tudo que representa: como documento, como história, pelo ideário iluminista que descreve em meio aos conflitos da época. Um secretário de Cultura, como Sérgio Paulo Rouanet, iluminista de coração e idéias, não deve deixar a coleção para a engorda das traças nem para sucumbir à umidade. Um poeta como Affonso Romano de Sant’Anna, diretor da Biblioteca Nacional, pode dar uma ajuda. Além de empresas privadas e ricos, destes que pouco fazem pelo país. Vale qualquer esforço para salvar um monumento que registrou um dos mais ricos períodos da história da humanidade.
* Wilson Coutinho, era carioca, jornalista, crítico de arte e mestre em Filosofia pela Universidade Católica de Louvain, Bélgica. Trabalhou nos jornais Opinião, Jornal do Brasil / Caderno Idéias, O Globo, Folha de São Paulo e Tribuna de Imprensa e nas revistas Veja e Arte Hoje. Foi curador e diretor do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro e vencedor, em 1969, do Concurso Esso de Literatura; idealizador e organizador das coleções Perfis do Rio, Arenas do Rio e Cantos do Rio. Faleceu em agosto de 2003.
Publicado no Jornal do Brasil, em 2/05/1992 – Caderno Idéias / Livros & Ensaios, pág. 3 - Retranca Recado
Colaboração: Antônio Emílio da Costa . jornalista
Wilson Coutinho
A Biblioteca Baptista Caetano d’Almeida, em São João d’el Rei, guarda uma relíquia em suas estantes, coleção única no Brasil e raríssima no mundo. Trata-se das edições do jornal Le moniteur universel – o órgão oficial da Revolução Francesa, ou melhor, da República. O acervo foi parar em Minas Gerais quando o fundador da biblioteca, Baptista Caetano, o adquiriu, em 1827, num leilão no Rio de Janeiro. Desconhece-se ainda quem foi seu proprietário original e como a valiosa coleção do jornal revolucionário veio parar no Brasil.
Lendas rondam São João d’el Rei, que como todas as cidades históricas mineiras têm prazer de cultivá-las. Conta-se que os jornais pertenciam aos inconfidentes ou que estudantes, em Coimbra ou Paris, os traziam escondidos como aríetes literários da subversão. Lendas boas de ouvir e que servem para puxar a imaginação. Imagine Bárbara Heliodora, mulher do inconfidente Alvarenga Peixoto, folheando as suas páginas, atrás de notícias sobre a Assembléia, ou lendo o processo que condenou Maria Antonieta.
Que as lendas vivam, mas o fato é que os jornais chegaram em São João d’el Rei no século passado. Le moniteur foi criado em 5 de maio de 1789 por Charles Joseph Packoucke, o célebre editor de Voltaire, e proprietário de Le Mercure de France. Foi transformado em diário em 24 de novembro, cuja primeira edição pode ser encontrada na Biblioteca Baptista Caetano d’Almeida.
O editorial não é, ao contrário dos panfletos da época, incendiário. Chama a atenção seu tom equilibrado, a proposta de publica seu noticiário com “exatidão pelos fatos, fidelidade escrupulosa na transcrição dos decretos”. Baseado nesses critérios, o jornal manteve-se, seguiu todas as marchas e contramarchas do período revolucionário e só fechou em 1901. Hoje é um documento de raro valor.
Historiadores franceses, quando visitam a biblioteca, ficam admirados em encontrar um tal monumento no Brasil. Mas há problemas. Apesar do esforço da Prefeitura e do carinho das bibliotecárias, a coleção luta contra traças, precisa de um local mais apropriado para ser guardada e necessita de trabalho de técnicos especializados para preservá-la antes que seja tarde demais.
É preciso salvar Le moniteur por tudo que representa: como documento, como história, pelo ideário iluminista que descreve em meio aos conflitos da época. Um secretário de Cultura, como Sérgio Paulo Rouanet, iluminista de coração e idéias, não deve deixar a coleção para a engorda das traças nem para sucumbir à umidade. Um poeta como Affonso Romano de Sant’Anna, diretor da Biblioteca Nacional, pode dar uma ajuda. Além de empresas privadas e ricos, destes que pouco fazem pelo país. Vale qualquer esforço para salvar um monumento que registrou um dos mais ricos períodos da história da humanidade.
* Wilson Coutinho, era carioca, jornalista, crítico de arte e mestre em Filosofia pela Universidade Católica de Louvain, Bélgica. Trabalhou nos jornais Opinião, Jornal do Brasil / Caderno Idéias, O Globo, Folha de São Paulo e Tribuna de Imprensa e nas revistas Veja e Arte Hoje. Foi curador e diretor do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro e vencedor, em 1969, do Concurso Esso de Literatura; idealizador e organizador das coleções Perfis do Rio, Arenas do Rio e Cantos do Rio. Faleceu em agosto de 2003.
Publicado no Jornal do Brasil, em 2/05/1992 – Caderno Idéias / Livros & Ensaios, pág. 3 - Retranca Recado
Colaboração: Antônio Emílio da Costa . jornalista