São João del-Rei, Tiradentes e Ouro Preto Transparentes

a cidade com que sonhamos é a cidade que podemos construir

la ciudad que soñamos es la ciudad que podemos construir

the city we dream of is the one we can build ourselves

la cittá che sognamo é la cittá che possiamo costruire

la ville dont on rêve c’est celle que nous pouvons construire

ser nobre é ter identidade
CADASTRE AQUI A SUA AÇÃO CULTURAL, PESQUISA, PROJETO, PRODUTO, ENTIDADES, LIDERANÇAS, AGENDA CULTURAL, ETC - CONTRIBUA, ATUALIZE, COMPARTILHE!

Publicações

Tipo: Artigos | Cartilhas | Livros | Teses e Monografias | Pesquisas | Lideranças e Mecenas | Diversos

Escopo: São João del-Rei | Tiradentes | Ouro Preto | Minas Gerais | Brasil | Mundo

 

Descripção da Villa, hoje cidade de São João del-Rei, na província de Minas Gerais . Império do Brasil . Francisco Freire de Carvalho (1854)

Descrição

Nas faldas d’agra montanha,
Que o Tejuco vae banhando
Ternas moções depertando
C’o seu doce murmurar:
N’um valle curvo e espraiado,
Que aureas arêas povoam,
Onde mil aves revoam
Com seu canto enchendo o ar:
Onde aqui e ali dispersas
Se observam toscas moradas,
As mais d’ellas povoadas
Por gente de negra côr:
Onde em paz vive e respira
Nos braços da Natureza,
A candura, a singeleza,
E talvez tambem o amor:
Em sitio ameno e risonho
D’este vale deleitoso
No logar mais espaçoso
Jaz a minha habitação.
Tão simples, como a minha alma,
Em moveis e architetura,
Entre as moradas figura
Da villa de S. João.
D’ella abaixo em curto espaço,
Curvos meandros fazendo,
Vae o ribeiro correndo,
Té n’um triste rio entrar.
De negro, funesto agouro
Nome tem as suas aguas,
Nome que horrores, que maguas
Só costuma despertar:
D’elle junto as margens tristes
Em já longa, escura idade
Victimas mil sem piedade
Cortou da parca o furor.
Rio das Mortes chamado
Desde então té nossos dias,
Desperta inda hoje agonia
Inda hoje desperta dor
Mas ao ribeiro voltando,
Que pelo valle serpeia,
D’elle oh quanto a fugaz veia
Limpida e bella não é!
N’ella a beleza a espelhar-se
Pode ver a imagem sua;
N’elle o sol, e a clara lua
Copiada a vivo se vê:
Nas duas margens oppostas
A illustre villa se assenta,
E aqui activa se alimenta
Commercio rico e feliz.
Por duas formosas pontes
De valente cantaria
Facil passo noute e dia
Provida industria abrir quiz.
Por ella frequente entrada
Tem do precioso a abundancia,
Que até de longa distância
Vem a villa abastecer.
O clima é doce e macio,
Qual da Europa o mais ameno,
Ar puro, limpo e sereno
Convida aqui a viver.
Os fructos d’outro hemispherio,
As plantas mais preciosas
Vegetam livres, viçosas
N’este abençoado terrão.
Da gente o trato é polido
É franco e hospitaleiro,
Entre o indigena e o estrangeiro
Não se observa distincção.
Gosam-se aqui as doçuras
D’uma justa liberdade;
A palavra humanidade
Não é som, ou noção vã:
Vive em paz das leis á sombra,
Quem do imperio as leis respeita;
Tranquillo á noute se deita,
Tranquillo o encontra a manhã.
Do valle em torno vistosas
Chacaras mil se descobrem,
Cujo chão frondoso cobrem
Lindos, uteis vegetaes.
Por entre as suas ramadas
De nunca extincta verdura
De modesta architetura
Se erguem tetos desiguaes:
Em vários d’elles habitam
Almas cândidas, singelas,
Que ajuntam ao ser de bellas
Milhares de perfeições.
Com suas mimosas graças,
Com seus dittos innocentes
Ateiam paixões ardentes
Nos sensiveis corações.
Dos effeitos da ternura
Se alguém quizer isentar-se,
Quem pretender esquivar-se
Do cego deus ao furor;
Ah! Fuja d’estas moradas
Fuja do sexo mimoso,
Aliás ser-lhe-há forçoso
Cingir os ferros d’amor:
São Circes mui perigosas
Irresistiveis Medeas;
Fazem coar pelas veias
Veneno prompto e lethal.
Fuja do lar, onde habitam
Thalia, Aglaura, Euphrosina,
Da joven, bella Erycina
Fuja da estancia fatal.
Com seus divinos encantos
Prendem tudo as tres primeiras,
Mandam nas almas inteiras
Co’as suas prendas sem par.
Erycina attrahe, commove
O mais intimo do peito,
Gera amor, gera respeito,
Chega as deusas igualar.
De Cypris une á belleza
De Juno o ar magestoso,
Sem ostentar um vaidoso
Frio, indiff’rente desdem.
É um céu limpo e sereno
Em manhã de primavera,
Que a esperança anima e gera,
Sem dar audacia a ninguem.
Com a rosa fresca e pura
Vence em fragancia as mais flores,
A lua como em fulgores
Vemos os astros vencer;
Erycina assim vencendo
Vae todas as formosuras,
Todas deixando ás escuras,
Mal que chega a apparecer.
Mas d’esta imperfeita copia
Quem é a imagem divina?...
Só o diria a Erycina,
A ninguem mais o direi:
Direi sim, sem que o segredo
Meu tema ver divulgado,
Que d’ella que for amado,
Por mui feliz contarei.
Aqui chegava: eis que a musa.
Que se dignou de inspirar-me,
Cessando de bafejar-me,
A penna me cae da mão:
Mas, se eu tenho desenhado
D’esta villa deleitosa
A producção mais mimosa;
Acabou-se a descripção.

Descrição escrita por FRANCISCO FREIRE DE CARVALHO e publicada no Jornal Litterario e Instructivo "O Panorama",
Vol. XI, Lisboa/Portugal, Tipografia do Panorama - Travessa da Victoria, 52, no ano de 1854.
Compartilhar no Facebook Compartilhar no Instagram Compartilhar no Whatsapp Imprimir

ESSE PORTAL É UM PROJETO VOLUNTÁRIO. NÃO PERTENCE À PREFEITURA MUNICIPAL | CADASTRE GRATUITAMENTE A SUA AÇÃO SÓCIOCULTURAL