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Passeio lendário . Carlos Herculano Lopes

Descrição

Estado de Minas 03/05/04

Em abril de 1924, há 80 anos, um grupo de paulistas ilustres, vindo do Rio de Janeiro, onde havia passado o Carnaval, chegava de trem a Minas Gerais, pouco antes da Semana Santa. Realizava, a partir de São Paulo, a famosa “Viagem de Descoberta do Brasil”, cujos desdobramentos, nos tempos seguintes, teriam grande importância para as artes nacionais, já que andaram por boa parte do País. Oswald de Andrade, com seu filho Nomê, Olívia Guedes Penteado, Tarsila do Amaral, Godofredo Teles, Mário de Andrade e Bleise Cendrars, um suíço-francês, entraram no Estado via São João del-Rei, para em seguida fazerem um giro turístico-cultural por outras cidades como Ouro Preto, Divinópolis e Mariana, até chegarem a Belo Horizonte, onde eram aguardados por uma turma de jovens escritores.

Iriam ainda a Sabará, Lagoa Santa e Congonhas. “Tive notícias do grupo na rua da Bahia, por Carlos Drummond, que estava convocando visitantes para irem ver os paulistas no Grande Hotel”, diz Pedro Nava em Beira-Mar. No entanto, apesar da “convocatória” de Drummod, segundo ainda o memorialista, só ele, o próprio poeta, Martins Filho e Emílio Moura compareceram ao encontro, talvez ainda sem saberem que ele entraria para a história. O Grande Hotel ficava onde hoje está o Edifício Arcanjo Maletta, na rua da Bahia, esquina de avenida Augusto de Lima.

Para lembrar esse fato, que foi um dos momentos mais fundamentais para a cultura mineira a partir da segunda década do século XX, a Prefeitura Municipal de Ouro Preto, através da secretaria de Cultura, promoverá em julho, durante o Festival de Inverno, uma série de eventos, além de representação teatral de grupos locais. Entre convidados para abordarem, em Ouro Preto, a famosa visita dos paulistas, está o ex-professor da UFMG e da Universidade de Brasília, Fernando Correia Dias, e o também professor Edmur Fonseca. Autor do livro Líricos & Profetas, no qual trata do tema, Correia Dias afirma que o encontro entre mineiros e paulistas “foi decisivo como delineador das diretrizes da literatura e da arte em Minas, naquele período e posteriormente, além de haver solidificado vínculos afetivos entre os componentes dos dois grupos”.

Desdobramentos: o professor, que vive em Lagoa Santa, lembra também, ainda em Líricos & Profetas, “que traziam os paulistas  notadamente Mário e Oswald, cada um a seu modo  considerável repertório de informação e treino crítico no tocante à realidade estética.” Ao passo que os mineiros “tinham sensibilidade apurada no convívio com a longa tradição intelectual de Minas: convívio que se fora tornando tenso, inquieto e criativo no decorrer da década de 20”. Dias Correia diz ainda que, como conseqüência da vinda dos paulistas, e do “tour” que fizeram pelas cidades históricas, com as quais se impressionaram, “o acervo barroco deixou de figurar como simples “décor” das solenidades religiosas e cívicas”. Em outras palavras: foi através dos paulistas que os mineiros redescobriram as belezas e a importância da arte barroca, até então esquecida, depois de haver sido imortalizada na época da colônia por mestres como Ataíde e Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho.

Ainda sobre os desdobramentos dessa visita, durante a qual, segundo Pedro Nava, os mineiros ouviam Oswald “tomados da maior admiração”, o professor Antônio Sérgio Bueno, autor do livro Modernismo em Belo Horizonte  Década de 20 (Editora UFMG), fala da criação, algum tempo depois, do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, idealizado pelos políticos mineiros Gustavo Capanema e Rodrigo Mello Franco. “Foi também resultado dessa experiência vivida em Minas o famoso poema Noturno de Belo Horizonte, de Mário de Andrade, além da série oswaldiana Roteiro das Minas, publicada no livro Pau Brasil”, lembra Sérgio Bueno, para quem a pintura de Tarsila do Amaral, após aquele lendário passeio, “passou a ter cores mais vivas”. Ao ponto de ela própria declarar tempos depois: “Encontrei em Minas as cores que adorava em minha infância.”

Já Mário de Andrade, logo em seguida àquela sua primeira visita a Minas, passaria a colaborar com A Revista, que era editada em Belo Horizonte, e a sua amizade com intelectuais mineiros, que duraria até a sua morte, em 1945, aos 52 anos, se estenderia ainda, nos tempos seguintes, a outros escritores da terra, entre eles a poetisa Henriqueta Lisboa, Murilo Rubião e João Etienne Filho, com os quais também o autor de Macunaíma e ícone maior do modernismo, manteve intensa correspondência, hoje registrada em livros. Ainda em Beira-Mar, Pedro Nava, ao relembrar os dias passados com os paulistas, descreve assim a figura de Mário de Andrade, observada com atenção durante passeio pelas ruas de Belo Horizonte:
“…Mas havia um homem ubíquo  que estava em toda parte. Era um moço falante, gargalhante e tamanhoso chamado Mário de Andrade, aliás Mário Raul de Almeida Leite Moraes de Andrade”.

NOTURNO DE BELO HORIZONTE

Mário de Andrade

Maravilha de milhares de brilhos e vidrilhos,
Calma do noturno de Belo Horizonte…
O silêncio fresco desfolha das árvores
E orvalha o jardim só.
Larguezas.
Enormes coágulos de sombra.
A polícia entre rosas…
Onde não é preciso, como sempre…
Há uma ausência de crimes
Na jovialidade infantil do friozinho (….)

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