São João del-Rei, Tiradentes e Ouro Preto Transparentes

a cidade com que sonhamos é a cidade que podemos construir

la ciudad que soñamos es la ciudad que podemos construir

the city we dream of is the one we can build ourselves

la cittá che sognamo é la cittá che possiamo costruire

la ville dont on rêve c’est celle que nous pouvons construire

ser nobre é ter identidade
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Vilas do Ouro . Maurício Lara

Descrição



São João del-Rei – O primeiro que chegou e ficou foi Tomé Portes del-Rei, ainda no fim do século 17. Naquele tempo, o lugar era mera passagem rumo ao sonho do Eldorado lá elos lado do Sabarabuçu e Portes descobriu um filão, que ainda não era de ouro: formou o primeiro aglomerado – Porto Real da Passagem do Rio das Mortes – e, com autorização de Portugal, cobrava pedágio para levar os aventureiros à outra margem do Rio das Mortes, além de vender suprimentos aos viajantes. “Eles estavam passando em cima de ouro aqui’, brinca o historiador Antônio Gaio Sobrinho.
Em 1705, Antônio Garcia da Cunha, genro do guarda-mor Tomé Portes, achou ouro de verdade na margem esquerda do Córrego do Lenheiro e outro aglomerado se formou o Arraial Novo de Nossa Senhora do Pilar do Rio das Mortes, em contraposição ao Arraial Velho de Santo Antônio da Ponta do Morro, no soe da Serra de São José, embrião da cidade de Tiradentes, onde o próprio Tomé Portes tinha descoberto o rico metal em 1702. O Arraial Novo é que deu origem, em 8 de dezembro de 1713, à Vila de São João del-Rei, a quarta criada em Minas Gerais pela coroa portuguesa, no inicio do século 18.
O ouro achado na região era farto. “Bastava arrancar um capim no alto do morro e ele vinha com ouro dependurado em suas raízes”, conta Antônio Gaio. A partir da descoberta, muito mais gente seguiu o exemplo de Tomé Portes, o primeiro a se estabelecer no lugar, inclusive com mulher e filhos, o que era raro naqueles tempos. Ao longo do século 18, São João del-Rei só perdia em importância para Vila Rica, a capital.
Para dar uma ideia da pujança da produção na época áurea, Antônio Gaia conta que o minerador João Rodrigues da Silva, dono de 400 escravos, mandou construir, para processamento do metal, um rego que atravessava toda a Serra do Lenheiro. E até hoje podem ser observadas as antigas betas, ou minas com características próprias, amplamente usadas na região.
A decadência do ouro, a partir da segunda metade do século 18, não levou São João del-Rei à estagnação, como ocorreu com a maioria das vilas. Com a chegada de dom João VI ao Brasil, em 1808, a Comarca do Rio das Mortes transformou-se em fornecedora de alimentos à corte. “Saíam seis ou mais tropas todos os anos levando mercadorias, como carne e toucinho, e voltavam carregadas de sal, tecidos, vinhos, ferramentas. No século 18, São João del-Rei viveu do comércio”, explica o historiador.
Essa diversificação da produção, conta ele, manteve a cidade viva. “Houve grandes comerciantes e o primeiro banco foi fundado aqui, em 1860.” O capital acumulado, que permitiu a criação do banco, facilitou também empreendimentos que levaram à região a ferrovia, em 1881, a energia elétrica, em 1900, e as tecelagens no início do século 20.
Se o bônus foi a economia permanecer ativa, o ônus foi uma significativa descaracterização do patrimônio arquitetônico. Antônio Gaio observa que o período do comércio levou à cidade o estilo neoclássico. Depois, já na República, com a ferrovia, chegou o eclético francês. Tudo se mistura com o barroco dos tempos coloniais. Outro ônus, na avaliação do historiador, é que a ferrovia permite a ligação direta de outras regiões com a corte, dispensando a intermediação dos comerciantes de São João del-Rei.
Mas, enquanto a arquitetura sofria as diversas influências, a cultura e a religiosidade atravessaram os séculos. “São João tem um aspecto de ter evoluído sem perder a identidade. As outras vilas ficaram estagnadas com o declínio da exploração do ouro. Aqui não dependia só de mineração. Houve um movimento cultural e religioso muito intenso”, afirma o pesquisador Aluízio José Viegas.
EVANGELHO - As tradições continuam vivas, passando de geração a geração. “Minha família está envolvida com a Igreja desde o século 18”, revela Viegas, enquanto exibe o livro do evangelho com capa de metal banhado a ouro, trabalhada pelo artesão João Bosco de Almeida Chaves para a Catedral de Nossa Senhora do Pilar. “Nós poderíamos levar só o livro às solenidades, mas fazemos a capa assim para dar nobreza às cerimônias”, explica.
Esse respeito às tradições é útil até na geração de emprego e renda para artesãos que esculpem imagens de santos ou preparam peças sacras para igrejas e particulares. Outra marca registrada da cidade é a música. “É uma tradição de pai para filho. Um colega puxa o outro”, diz a professora de violino Irene Sacramento, de 80 anos, que perdeu a conta de quantos alunos teve.
Ela é atuante na Lira Sanjoanense, fundada em 1776, e considerada a mais antiga das Américas em atividade. Outra orquestra do século 18 em pleno movimento é a Ribeiro Bastos. Os músicos de uma e de outra tinham apelidos. Os da Lira eram os rapaduras, porque atuavam mais nas festividades ligadas às irmandades dos negros; os da Ribeiro Bastos eram os coalhadas, mais presentes nas festas dos brancos.
Geraldo Ivon da Silva, o Geraldo Patusca, colega de Irene Sacramento na Lira Sanjoanense, tocou violino na orquestra durante 78 anos. Agora, aos 92, Patusca, filho de tocador de cavaquinho, se orgulha de ser o músico mais velho da Lira. Ele e Irene conhecem bem outra marca da cidade: a linguagem dos sinos. Para cada celebração, os sinos, que têm nome de gente, exibem mum badalar específico. E isso também é uma tradição que vem de longe.
“Principalmente na questão religiosa, criou-se uma estrutura importante”, explica Aluízio Viegas. A base dessa estrutura está nas Irmandades, que cuidam com zelo do patrimônio religioso. “Em outras cidades as irmandades acabaram e aqui elas ainda são atuantes”, garante o pesquisador.

Marcos de um tempo
O visitante que chegas à cidade, de 82 mil habitantes, no Campo das Vertentes, a 180 quilômetros de Belo Horizonte, dispõe de 30 guias da Associação Sanjoanense de Guias de Turismo preparados para mostras as relíquias. O presidade da entidade, Luiz Antônio Sacramento de Miranda, tem na ponta da língua as histórias que cercam cada prédio e cada rua. A mais antiga, onde tudo começou, é a Rua Santo Antônio, ponta do caminho geral do sertão, com suas casas aparentemente fora de prumo, obedecendo à curva de nível do terreno. A casa mais antiga está na Rua das Mônicas e tem “varanda paulista” onde os moradores penduravam as armas para intimidar os agressores. Sobre o Córrego do Lenheiro estão as duas pontes de pedra do século 18. As igrejas bem cuidadas e preservadas, incluem a Catedral Basílica de Nossa Senhora do Pilar, de 1721; a Igreja de São Francisco de Assis, de 1774, em cujo cemitério está enterrado o ex-presidente Tancredo Neves; a Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, construída em 1708 pela irmandade considerada a mais antiga de Minas, chamada de Nossa Senhora do Rosário de São Benedito dos Homens Pretos. Ao lado da Igreja de Nossa Senhora do Carmo, de 1733,a única no Brasil com torre octogonal, está o cemitério da Ordem Terceira de Nossa senhora de Monte Carmelo que, visto de fora, parece um mosteiro. Quase todo coberto, o cemitério tem gavetas nas paredes e túmulos. O guia Luiz Antônio conta que, ironicamente, em prédio anexo do cemitério funcionava um asilo de velhos.

 



Jornal Estado de Minas . 07 de junho de 2009
Maurício Lara
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