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Semana Santa 09: Irmandades, garantia de manutenção das tradições . Antônio Gaio Sobrinho

Descrição

Notícia de Domingo, 5 de Abril de 2009

 

Na cidade temos nove associações originadas no século 18

Surgidos na Baixa Idade Média, as Irmandades ou Confrarias, senão também as Ordens Terceiras, correspondiam na organização religiosa ao que as Corporações de Ofícios representavam no mundo do trabalho urbano. Nova forma de sociabilidade, elas eram uma correspondência leiga das Ordens Religiosas Monásticas e Mendicantes, com o objetivo principal de promover o culto dos santos, seus padroeiros, e assistir espiritual e materialmente os seus componentes.
Vindas para o Brasil nas caravelas portuguesas, encontraram na Capitania de Minas Gerais do século 18 o seu sagrado por excelência, em virtude também da proibição de se estabelecerem aqui as Ordens Religiosas Primeiras. Como em qualquer de nossos antigos arraiais ou vilas, também em São João del-Rei sua presença marcou indelevelmente a nossa formação histórica e cultural.

Fé discriminada

No início, dada a polarização social predominante, apareceram as Irmandades do Santíssimo Sacramento e de Nossa Senhora do Rosário, para os senhores brancos e escravos negros, respectivamente. Com o decorrer dos anos e a diversificação social e econômica conseqüente, novas associações foram surgindo, apropriadas à condição de vários segmentos, tais como pardos, forros, músicos, carapinas, comerciantes, intelectuais, autoridades militares, etc. Cada uma delas logo tratou, senão de edificar, numa rica competição, sua própria igreja, pelo menos de estabelecer um altar lateral no transepto ou nas coxias da Matriz, que o altar e a capela mores eram sempre privilégio da Irmandade do Santíssimo.
É assim que, ainda hoje, temos, na cidade, nove associações originadas do século 18, sem mais as segregações racistas e ou econômicas de então. As sediadas na Matriz têm cada qual seu próprio consistório, seu altar, seu dia semanal de culto, seu sino nas torres e sua repartição no cemitério comum, na rua das Flores.

 "Sangue não infecto" precede negros

Balandraus, opas, hábitos, capas...

Nas nossas procissões, como a do Enterro e a do Santíssimo Sacramento, em que todas elas participam uniformizadas, portando suas cruzes, ciriais, tochas e varas, cada qual tem seu lugar definido historicamente de acordo com uma ordem de precedência, espécie de direito adquirido.
Essa precedência é inversa ao sentido do desfile, isto é, a precedência é contada de trás para frente. Quanto mais atrás, maior a dignidade do lugar e, portanto, melhor a precedência. Os fatores que determinam a maior ou menor precedência sacra são: a) as Ordens Terceiras têm precedência absoluta, b) as associações de brancos precedem as de negros, c) no âmbito das condições anteriores, as mais antigas precedem as mais recentes.
 No caso são-joanense a ordem de precedência está assim constituída: Confraria de São Gonçalo Garcia (1759) com balandraus ou hábitos pretos, Arquiconfraria de Nossa Senhora das Mercês (1750) com balandraus ou hábitos bege, Confraria de Nossa Senhora da Boa Morte (1732) com balandraus ou hábitos brancos e capinhas ou capas azuis, Confraria de Nossa Senhora do Rosário (1708) com balandraus ou hábitos brancos e capinhas ou capas pretas, Irmandade de Nosso Senhor dos Passos (1733) com balandraus roxos, Irmandade de São Miguel e Almas (1716) com opas verdes, Irmandade do Santíssimo Sacramento (1711) com opas vermelhas, Ordem Terceira de São Francisco de Assis (1749) com hábitos pretos, e Ordem Terceira de Nossa Senhora do Carmo (1746) com opas ou hábitos marrons. As quatro primeiras, originariamente, eram próprias, sem exclusividade, dos vários segmentos negros, e as cinco últimas eram destinadas as camadas brancas, consideradas de sangue não infecto. Opas são uma espécie de meia túnica que se ajusta sob a gola do paletó. Balandraus diferem das opas por disporem de uma gola ou capinha que cai sobre os ombros. Ordens Terceiras, Confrarias e Arquiconfrarias gozam do privilégio de poderem usar hábito talar e capas.
É curioso que, também no interior de cada associação, existe uma ordem entre os irmãos, quando caminham processionalmente em filas ou alas. Os mais novos de filiação vão na frente dos mais antigos e os ocupantes de cargos hierárquicos, por último, na seguinte ordem: andadores, procuradores, e, na ala esquerda, o tesoureiro e o vice-provedor, na ala direita, o secretário e o provedor. Estes quatro últimos, quando nas procissões, carregam varas de prata como insígnias de seus cargos. Nas varas do secretário e do tesoureiro vêem-se incrustadas uma pena e uma chave, respectivamente simbolizando a função de escrevente e de guarda-cofre.
De todas as Irmandades e Confrarias, a mais importante, até pela sua própria denominação, é a Irmandade do Santíssimo Sacramento, só constituída nas Matrizes, dos quais é considerada a Fabriqueira. Sua ereção canônica em São João del-Rei deu-se no dia 8 de fevereiro de 1711 e, desde então, tem sido ela agente importante na realização da nossa tradicional Semana Santa. Também importante para os festejos quaresmais é a Irmandade dos Passos, promotora das vias-sacras de ruas, da procissão do Encontro e do Setenário das Dores com sua procissão final.

*Antônio Gaio Sobrinho é são-joanense, escritor e historiador.

Fonte: Rádio São João del-Rei

 

 

 

 

 

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