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Formação docente em São João del-Rei no final do século XIX: um estudo a partir do Colégio Normal Nossa Senhora das Dores . Maria Aparecida Arruda -

Descrição

FORMAÇÃO DOCENTE EM SÃO JOÃO DEL-REI NO FINAL DO SÉCULO XIX: UM ESTUDO A PARTIR DO COLÉGIO NORMAL NOSSA SENHORA DAS DORES
 
Maria Aparecida Arruda Universidade Federal de São João del-Rei
email: cida@ufsj.edu.br  
Palavras-chave: Colégio Normal Nossa Senhora das Dores – Ensino religioso – Formação Docente.  

O tema formação docente tem sido objeto das pesquisas que venho desenvolvendo nos últimos anos e está inserido em um projeto de maior alcance em que busco refletir não só o processo de formação docente, mas a sua triangulação em que estão presentes o ensino confessional católico e a questão de gênero. Faço isso a partir do estudo do Colégio Normal Nossa Senhora das Dores, buscando entender as condições de possibilidades e as circunstâncias que contribuíram para sua criação na cidade de São João del-Rei, Minas Gerais, onde está localizado. Os acontecimentos que envolveram a criação, instalação e funcionamento da instituição estiveram na ordem do debate sobre os quais procurei investigar. Nesta incursão a atenção se voltou para a busca da constituição da profissionalização docente, a inserção do público feminino no processo de escolarização, as condições que permitiram o acesso desse segmento aos saberes escolares, assim como a permanência desses sujeitos no espaço escolar. As condições de estabelecimento da instituição na cidade estiveram intimamente relacionados à vinda das Filhas da Caridade da Sociedade São Vicente de Paulo, fator que levaria ao estudo da congregação a partir de um determinado “modelo” de educação desenvolvido no interior da Igreja Católica: a pedagogia vicentina.  
Na mesma direção, foi realizado um estudo acerca da congregação, a produção discursiva voltada para os saberes e práticas educativas desenvolvidas pela Igreja e implementadas pelas freiras vicentinas na cidade de São João del Rei, bem como o estatuto de organização da própria ordem, que regulamenta essas práticas, configurando um sistema de regras – seus princípios e normatizações.  
O ensino no Colégio esteve voltado para um público exclusivamente feminino nos anos iniciais de seu funcionamento, o que fez emergir a necessidade de observar a construção social das relações de gênero, cujo entendimento flexiona-a no plural diante da multiplicidade de vivências e condições, conjugando-as a partir de uma perspectiva relacional.  Cabe aqui a ressalva acerca da questão do gênero, dado que ele se insere no debate à medida que esse público constituiu-se das condições de funcionamento da instituição nos anos iniciais de funcionamento. Isto implica dizer que a análise não foi direcionada à mulher no singular, visto que “nenhuma compreensão de qualquer um dos [sexos] pode existir [por meio] de um estudo que os considere totalmente em separado”, conforme enfatiza SOIHET (1997, p. 279).  
Nestas circunstâncias a profissionalização do magistério foi problematizada. Vista pelos historiadores como um movimento em consolidação, vários estudos observam que a profissionalização docente da escola elementar, no final do século XIX e início do XX, passou a ser constituída por mulheres, diferentemente de anos anteriores cujo espaço era ocupado exclusivamente por homens.  
A expansão da educação feminina, assim como o fortalecimento da religião e das interdições ao mundo moderno teve suas discussões fortalecidas no século XIX. Tanto o Estado quanto a Igreja, acreditando no poder de ampliação de seus interesses, buscam, por meio desse público, ampliar os seus interesses. O que variava na aplicação e efetivação das escolas eram as relações político-religiosas locais.  
Minas Gerais, já identificada como de gente que se diz “modesta e ordeira”i, esteve inserida nesta discussão e a mulher, como venho buscando mostrar, instrumento da expansão do catolicismo.  
A instalação do Colégio em São João del-Rei constituiu-se em fato de destaque dado ao processo de modernização/urbanização que vinha sendo experimentado no país. São João del-Rei, em sua especificidade, não fugia a esse processo e passou, no início do século XX, por mudanças importantes, marcados pelo discurso da modernidade e do progresso. A modernidade aqui considerada como as transformações no espaço urbano de São João del-Rei encontrou na cidade um espaço privilegiado para essa materialização. Nela uma nova paisagem foi se projetando, tendo como base o desenvolvimento industrial, a remodelação dos espaços, os novos meios de comunicação e, conseqüentemente, um maior crescimento populacionalii.  
As práticas de reconfiguração urbana advinda das diversas concepções (política, econômica, cultural, social, educacional...) abrem margem para a compreensão de que, na tentativa de configurar o cenário moderno, estratégias foram acionadas, de modo a provocar interferências no modo de ser, pensar e agir da população capaz de conformar, na população, uma atitude modernaiii.  
Os hábitos populares se tornavam alvo de especial atenção e medidas foram tomadas para adequar homens e mulheres, inculcando-lhes valores e formas de comportamentos que passavam pela rígida disciplinarização do espaço e do tempo.  
Nesta perspectiva, a constituição de espaços e tempos escolares recaía não só para a criação de salas de aula, mas também para a formação de professores de modo que a modernidade fosse incorporada aos atos, falas e modos dos habitantes.    
Uma das apostas recaía sobre o investimento na expansão das áreas de atuação da forma escolar nos moldes a que Vicent, Lahire e Thin (2001)iv a nomearam para se referir a uma forma especificamente escolar de socialização da infância e da juventude. Nesse novo formato buscava-se a configuração e difusão da instituição escolar, cujos saberes e práticas específicos de sociabilidades, uma vez despertados, inculcados e exercitados nos espaços e tempos escolares, ultrapassassem os muros e portões da escolav e, na seqüência, contribuíssem para a (re)construção e organização do espaço público da cidade. Nessa medida, tomada pelas necessidades e exigências sociais que insistiam na urgência em controlar e fiscalizar a ocupação populacional no ideal de reorganizar o cenário urbano, esteve em cena preocupações em (re)significar os possíveis papéis que seriam desempenhados pela populaçãovi.  
Ao se debruçar sobre as fontes documentais referentes ao século XIX, percebese que havia um vigoroso debate em torno da questão educacional no País (GOUVÊA, 2201). Tal debate, iniciado no período imperial, ganha contornos maiores na definição de políticas de atuação no período republicano, acompanhado da adoção, nesta perspectiva, de uma metodologia de ensino cientificamente fundada que uniformizasse as práticas pedagógicas.  
O presente estudo se insere neste debate, tendo como fonte uma vasta documentação localizada no Colégio Nossa Senhora das Dores aspectos da formação docente e da profissionalização do magistério na cidade de São João del Rei, tendo como recorte os anos finais do século XIX e o início do século XX. Consta desta documentação livros de atas, exames, matrículas, disciplinas lecionadas, livros de registros de ofícios e documentos, termos de visitas de inspetores de ensino e outros. O material consultado foi localizado no CNSD, no Arquivo Público Mineiro, constituindo ainda de relatórios de Província/Estado do período. Soma-se a essa documentação a legislação e os regulamentos vigentes no período.  
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