a cidade com que sonhamos é a cidade que podemos construir

la ciudad que soñamos es la ciudad que podemos construir

the city we dream of is the one we can build ourselves

la cittá che sognamo é la cittá che possiamo costruire

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Carnaval de São João del-Rei . Francisco Braga

Descrição

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Carnaval de São João del-Rei e região . Memórias, dados e imagens

AS RAÍZES DO CARNAVAL NA GRÉCIA ANTIGA
Por Francisco José dos Santos Braga

I.  INTRODUÇÃO

Entre diferentes visões acerca dos Anthestéria, festas dionisíacas que serão tratadas aqui, W. Verrall (Journal of Hellenic Studies, xx., 1900, p. 115), pela primeira vez, explicou o nome diferentemente, como uma festa de revocação das almas dos mortos com o objetivo de trazê-las de volta ao mundo. Durante os festejos atenienses dos Anthestéria, segundo Verall, os espíritos dos mortos eram trazidos à terra dos vivos.
 
Também em Roma, acreditava-se que uma pedra cobria uma caverna (mundus Cereris ou mundus cerialis) que se supunha ser uma entrada para o mundo subterrâneo no Palatino. Esse portal para o submundo era obstruído por uma pedra, lapis manalis, que permitia aos Manes se juntarem aos vivos.
 
Plutarco, no capítulo em que descreve a fundação de Roma, diz que o "mundus", da mesma forma que os marcos de uma cidade, tinha origem etrusca. As primícias de todas as espécies eram lançadas na caverna. Também sabe-se que cada novo fundador trazia um pouco de terra de seu próprio país e lançava-o na caverna. Assim fazendo, Plutarco ligava o "mundus" romano ao centro religioso da cidade de Roma, umbilicus urbis Romae. Esse autor ainda coloca a caverna no Comitium ao invés do Palatino, mas observa que a palavra "mundus" possui identidade com o que entendemos por mundo.
 
Essa pedra era cerimonialmente aberta três vezes por ano, durante as quais os espíritos bem aventurados ou Manes podiam por-se em contato com os vivos. Os três dias  em que omundus era aberto eram os seguintes: 24 de agosto, 5 de outubro e 8 de novembro. Frutos da colheita eram oferecidos aos mortos nessa ocasião. Macrobius, citando Varro, diz desses dias que
Mundus cum patet, deorum tristium atque inferum quasi ianua patet.

Quando o mundo está aberto, é como se uma porta fica aberta para os deuses desgraçados do mundo ínfero. (Cf. Mundus patet)
 
Neste trabalho apresentarei duas abordagens que se complementam para as festas conhecidas por Anthestéria, a saber, primeiro a minha tradução de um texto que está fazendo muito sucesso na Grécia intitulado "AS RAÍZES DO CARNAVAL NA GRÉCIA ANTIGA" e depois, observações pertinentes a esses festejos dionisíacos, por parte do saudoso Prof. Junito de Souza Brandão (1924-1995), catedrático da cadeira de Mitologia Grega e Latina na PUC-RJ, autoridade no assunto e um dos maiores expoentes em mitologia no mundo.

Também a próxima seção, intitulada "Dioniso, deus do êxtase e do entusiasmo", reproduz o pensamento de Brandão, esclarecendo porque um deus, que faz seu aparecimento tão tardio na pólis ateniense (século VI a.C.), de certa forma contrapondo-se aos deuses do Olimpo, teve uma marcante influência sobre todo o mundo, bastando consultar o verbete "Carnival" na Wikipedia para verificar sua popularidade universal. 

II.  DIONISO, deus do êxtase e do entusiasmo

BRANDÃO (1991, vol. I, 285-292), no verbete "Dioniso", faz as seguintes observações: 
"Dioniso é um deus "novo" na pólis. Deus dos campônios, veio possivelmente da Trácia. Aparece muito pouco nos poemas homéricos (poemas da elite) séc. IX-VIII a.C., onde não se lhe dá a menor importância: Ilíada, VI, 132, XIV, 325; Odisséia, XI, 325, XXIV, 74, mas o deus já estava na Hélade desde pelo menos o séc. XIV a.C., como demonstram as tábulas micênicas de Pilos. (...) 
Dioniso, também chamado Baco, tornou-se, a partir do séc. VI a.C., um deus essencialmente da videira, do vinho, do delírio místico e do teatro. Seu mito é complexo, porque é formado de elementos por vezes díspares, provindos de locais diversos, sobretudo da Ásia Menor. O todo apresenta-se, não raro, como uma soma de episódios mal alinhavados em torno de um núcleo central. (...) 
Nascido da coxa de Zeus, Dioniso se tornou tão poderoso, que desceu até o fundo do Hades para de lá arrancar sua mãe Sêmele, conferir-lhe a imortalidade (o que mostra ter sido Sêmele um dos avatares da deusa terra), mudar-lhe o nome para Thyone e com ela escalar o Olimpo. 
Viu-se que o filho de Zeus foi levado para o monte Nisa e entregue aos cuidados das Ninfas e dos Sátiros. Pois bem, lá, em sombria gruta, cercada de frondosa vegetação e em cujas paredes se entrelaçavam galhos de viçosas vides, donde pendiam maduros cachos de uva, vivia feliz o jovem deus. Certa vez, este colheu alguns desses cachos, espremendo-lhes as frutinhas em taças de ouro e bebeu o suco em companhia de sua corte. Todos ficaram então conhecendo o novo néctar: o vinho acabava de nascer. Bebendo-o repetidas vezes, Sátiros, Ninfas e o próprio filho de Sêmele começaram a dançar vertiginosamente ao som dos címbalos, tendo a Dioniso por centro. Embriagados do delírio báquico, todos caíram por terra semidesfalecidos.  
Historicamente, por ocasião da vindima, celebrava-se, a cada ano, em Atenas e por toda a Ática, a festa do vinho novo, em que os participantes, como outrora os companheiros de Baco, se embriagavam e começavam a cantar e a dançar freneticamente, à luz dos archotes e ao som dos címbalos, até caírem desfalecidos. Esse desfalecimento se devia não só ao novo néctar, mas ao fato de os "devotos do vinho" e do deus se embriagarem de êxtase e de entusiasmo, cujo sentido bem como cujas consequências se podem ver em Mitologia Grega, Vol. II, p. 123 sqq. e no verbete Antestérias. (...) 
Já como deus do Olimpo foi que Dioniso raptou Ariadne em Naxos e tomou parte ao lado de Zeus e de outros imortais na luta contra os Gigantes, tendo inclusive matado a Êurito com um golpe de tirso. Deus das orgias, do êxtase e do entusiasmo e deus da liberação, Dioniso era festejado com procissões ruidosas, que, na realidade, nunca deixaram de existir, mas que acabaram também por dar origem ao ditirambo, ao drama satírico, à tragédia e à comédia. 
Com a helenização de Roma, a partir do séc. III a.C., os mistérios dionisíacos com a sua licenciosidade e características orgiásticas, aliás mal compreendidas e interpretadas pelos descendentes de Rômulo, penetraram particularmente na Itália central e meridional. O Senado romano, por um decreto do ano 186 a.C. (Senatus consultum de Bacchanalibus), "também por motivos políticos", proibiu sob pena de morte (o que a bem da verdade jamais foi levado muito a sério) as chamadas Bacchanalia, "Bacanais". 
As seitas místicas , por isso mesmo, sempre mantiveram a tradição dionisíaca e o deus das orgias chegou inteiro à época imperial." (grifo meu) 
Alhures, BRANDÃO (1988, vol. II, 123-126) coloca uma interessante indagação sobre o aparecimento do culto ateniense tardio a Dioniso, à qual responde:  
"Dioniso somente fez seu aparecimento solene e "oficial" na pólis de Atenas, assim como na literatura grega e, por conseguinte, na mitologia, a partir do século VI a.C. Por que tão tardiamente, se, como se disse, o filho de Zeus e Sêmele já aparece "atestado" lá pelo século XIV a.C.? A explicação não parece difícil. Dioniso é um deus essencialmente agrário, deus da vegetação, deus das potências geradoras e, por isso mesmo, permaneceu por longos séculos confinado no campo. É que Atenas, até os fins do século VII a.C., foi dominada pelos Eupátridas, os bem-nascidos, os nobres, que, sendo os únicos que se podiam armar, eram igualmente os únicos que podiam defender a pólis, tornando-se esta propriedade dos mesmos. (...) Senhores de tudo, eram também senhores da religião. Seus deuses olímpicos e patriarcais (Zeus, Apolo, Posêidon, Ares, Atená...), projeção de seu regime político, em troca de hecatombes e de renovados sacrifícios, mantinham-lhes a pólis e o status quo. A pólis e seus Eupátridas eram politicamente guardados pelos imortais do Olimpo.
Somente no século VI a.C., com o enfraquecimento militar e, por conseguinte, políticos dos Eupátridas, (...) é que o povo começou a ter certos direitos na pólis. As sementes da democracia frutificaram-se rapidamente, como é sabido, e de Sólon, passando por Pisístrato e depois por Clístenes, Efialtes e Péricles, a árvore cresceu e o povo teve, afinal, um vasta sombra onde refugiar-se. Sua voz soberana se fez ouvir: era a ekklesía, a assembleia do povo. Com o povo e a democracia, Dioniso, de tirso em punho, seguido de suas Mênades ou Bacantes, suas sacerdotisas e acólitas, fez sua entrada triunfal na pólis de Atenas. 
Além do mais, é conveniente acentuar que a "demora" de Dioniso deve-se ainda ao próprio caráter do deus: o filho de Sêmele é o menos "político" dos deuses gregos. Enquanto os outros imortais disputavam a proteção, a posse e a eponímia das cidades helênicas, não se conhece cidade alguma que se tenha colocado sob sua proteção. Na realidade, Dioniso permaneceu estranho à religião da família bem como à da pólis e, conforme acentua (JEANMAIRE, 1978, p. 8) em seu livro Dionysos, existe latente no dionisismo, ao menos sob forma elementar, um conflito entre a vocação religiosa e o conformismo social, embora sancionado pela religião. Ao contrário de Apolo, jamais houve um Dioniso nacional e nem tampouco um Dioniso sacerdotal. Deus imortal, talvez o filho de Sêmele tenha sido mais humano que o próprio homem grego. 
E se se esperou tanto por Dioniso, é ainda e sobretudo porque "sua religião" colidia frontalmente com a religião "política" dos Eupátridas, apoiados nos deuses olímpicos tradicionais e despóticos.  
Expliquemo-nos. Na Grécia, as correntes religiosas místicas (Mistérios, Orfismo, Pitagorismo, Dionisismo...) confluem para uma bacia comum: sede de conhecimento contemplativo (gnôsis); purificação da vontade para receber o divino (kátharsis); e libertação desta vida, que se estiola em nascimentos e mortes, para uma vida de imortalidade (athanasía). Mas essa mesma sede de imortalidade, preconizada por mitos naturalistas de divindades da vegetação, que morrem e ressuscitam (Dioniso sobretudo), essencialmente populares, chocava-se violentamente, e ver-se-á por que, com a religião oficial e aristocrática da pólis: os deuses olímpicos sentiam-se ameaçados e o Estado também. Assim, a imortalidade na Grécia tornou-se uma espécie de competição. Justificam-se, desse modo, na Hélade, sob a tutela religiosa do Oráculo de Delfos, tantos apelos à "sophrosyne"(moderação); "gnôthi s' autón" (conhece-te a ti mesmo); "medèn ágan" (nada em demasia)...  
A respeito dessa oposição feita à penetração do culto de Dioniso na Grécia, Brandão citou Mircea Eliade: "Qualquer que seja a história da penetração do culto dionisíaco na Grécia, os mitos e os fragmentos mitológicos que aludem à oposição encontrada têm uma significação mais profunda: eles nos informam ao mesmo tempo da experiência religiosa dionisíaca e da estrutura específica do deus. Dioniso devia provocar resistência e perseguição, pois a experiência religiosa, que suscitava, punha em risco todo um estilo de vida e um universo de valores. Tratava-se, sem dúvida, da supremacia, ameaçada, da religião olímpica e de suas instituições. Mas a oposição denunciava ainda um drama mais íntimo, e que aliás está abundantemente atestado na história das religiões: a resistência contra toda experiência religiosa absoluta, que só pode efetuar-se, negando-se o resto (seja qual for o nome que se lhe dê: equilíbrio, personalidade, consciência, razão, etc.)." (grifo meu)  
III.  As Raízes do Carnaval na Grécia Antiga (texto traduzido por mim e acompanhado de observações correspondentes de Junito de Souza Brandão)

As raízes dos costumes do Carnaval localizam-se na Grécia Antiga, precisamente nas festas dionisíacas, nas festas florais ¹ , nos Anthestéria² e nas festas da Trácia, etc.
 
Festas florais: festa ática dionisíaca

As festas florais constituíam uma comemoração anual do renascimento da natureza e dos mortos em honra de Dioniso Lacustre e de Hermes Ctônico. Aconteciam em Atenas durante o mês Anthesterióna (fim de fevereiro, início de março), ao longo de três dias. Conjetura-se que o nome da festividade venha de "florescer" ³, relacionando com o costume de no segundo coroarem-se os meninos de três anos com flores. Uma vez que os Anthestéria não era festa das flores, sustentara-se antigamente que a perspectiva como também o nome Anthestéria de toda a festividade não se relacionasse com as plantas, mas com o verbo revocar (as almas), trazê-las de volta ao mundo ⁴, relacionando a etimologia com o terceiro dia da festividade que era dedicado às almas dos mortos.
Resumidamente os eventos dos três dias dos Anthestéria eram os seguintes:

1º dia - Pithíguia


* Abriam os potes de barro com o vinho novo
* Costumavam trazer o primeiro vinho ao santuário de Dioniso em Límnais
* Faziam libações fora do templo fechado do deus, em homenagem a ele os que oram vão consumir favoravelmente a nova produção
* Provavam eles mesmos o vinho e dançavam e cantavam agradecendo a Dioniso
* Naquele dia e no seguinte, os Atenienses permitiam aos escravos beberem com eles. 

BRANDÃO (1988, vol. II, 133-134) faz a seguinte descrição do primeiro dia dos Anthestéria: 
"(...) abriam-se os tonéis de terracota, em que se guardava o vinho da colheita do outono, e transportavam-nos até um Santuário de Dioniso ou Lénaion, que só se abria por ocasião dessas festas da primavera. Dessacralizava-se o vinho novo, quer dizer, levantava-se o tabu que ainda pesava sobre a colheita anterior ⁵e, após uma libação a Dioniso pela boa safra, dava-se início à bebedeira sagrada. Possivelmente, como nas Dionísias Rurais e nas Lenéias, também os escravos participavam dessa confraternização, porque uma das características fundamentais de Dioniso, "deus do povo", é sua universalidade social."
2º dia - Khóes
 

* Acontecia a saída processional de Dioniso na cidade em cima de barco com rodas
* Em cima do barco havia fantasiados em pajens do deus Dioniso. Esses fantasiados eram os Sátiros e zombavam das pessoas com as obscenidades criando bom humor, alegria e espírito cômico
* Os Sátiros fantasiados usavam máscara. Essas máscaras eram de argila e semelhantes entre si
* Outros Sátiros usavam peles de animais, untavam o seu rosto com a borra do vinho e se coroavam com hera, a sempre verde planta sagrada de Dioniso ⁶
* Os Sátiros tentavam parecer com os bodes e característico dos bodes é a sua imensa propensão aos afrodisíacos
* Os Sátiros saltavam em volta do barco com rodas de Dioniso batendo no chão com seus pés (talvez daqui proveio a palavra Carnaval, uma vez que significa dança dos caprinos ⁷, que podem ser bode, cabra ou carneiro.
*Acontecia o "casamento sagrado" do deus com a esposa do rei soberano, o qual era chefe do clero e de todos os dignitários religiosos de Atenas
* Aconteciam jogos de bebida de vinho
* Na tarde dos Khóes eram comuns nas ruas "os insultos das carruagens", ou seja, caçoadas contra transeuntes (frequentes também nas festas das Lenéias). 

BRANDÃO (1988, vol. II, 134-135) descreve assim o segundo dia dos Anthestéria: 
"(...) Era o dia consagrado ao concurso dos beberrões. Vencedor era aquele que esvaziasse o cântaro (três litros e um quarto) mais rapidamente. O prêmio era uma coroa de folhagens e um odre de vinho. Nesse mesmo dia, em que se celebravam as Khóes, organizava-se uma solene e ruidosa procissão para comemorar a chegado do deus à polis. Mas, como Dioniso está ligado ao elemento úmido, por ser uma divindade da vegetação, supunha-se que ele houvesse chegado a Atenas, vindo do mar. É, por esse motivo, que integrava o cortejo uma embarcação, que deslizava sobre quatro rodas de uma carroça, puxada por dois Sátiros. Na embarcação via-se o deus do êxtase, empunhando uma videira, ladeado por dois Sátiros nus, tocando flauta. Um touro, destinado ao sacrifício, acompanhava o barulhento cortejo, cujos componentes, provavelmente disfarçados em Sátiros e usando máscaras, cantavam e dançavam ao som da flauta. Quando a procissão chegava ao santuário do deus, no Lénaion, havia cerimônias várias, de que participavam Basílinna, isto é, a esposa do Arconte Rei e quatorze damas de honra. A partir desse momento, Basílinna, a Rainha, herdeira da antiga rainha dos primeiros tempos da cidade, era considerada esposa de Dioniso, certamente representado por um sacerdote com máscara. Subia para junto dele na embarcação e novo cortejo, agora de caráter nupcial, conduzia o casal para o Bukolíon, etimologicamente, "estábulo de bois", mas, na realidade, uma antiga residência real na parte baixa da cidade. Ali se consumava o hieròs gámos, o casamento sagrado entre o "deus" e a rainha, conforme atesta Aristóteles,Constituição de Atenas, L3, c5. Observe-se que o local escolhido, o Bukolíon, atesta que a hierofania taurina de Dioniso era ainda um fato comum. De outro lado, sendo a união consumada naresidência real e apresentando-se Dioniso como rei, o deus estava exatamente exercendo a função sagrada da fecundação. Essa hierogamia era, na realidade, o símbolo do casamento, da união do deus com a pólis inteira, com todas as consequências que daí poderiam advir." 
BRANDÃO (1988, vol. II, 127) diz das Lenéias que  
"pouco se conhece também acerca dessa festa muito antiga do deus do vinho. O nome Lenéias é uma abreviatura já comum em Atenas, pois que a designação oficial da festa era Dioniso do Lénaion, isto é, cerimônias religiosas dionisíacas que se realizavam no Lénaion, local onde se erguia o mais antigo templo do deus e, mais tarde também, um teatro. Segundo os arqueólogos que se têm ocupado da topografia da Atenas antiga, esse espaço consagrado ao deus do êxtase e do entusiasmo talvez se localizasse ou nas vizinhanças da antiga Ágora e da rampa que levava à Acrópole ou, ao contrário, na outra extremidade da rocha, que sustém a Acrópole, isto é, aos pés de sua fachada oeste. Se ainda se discute acerca da localização do Lénaion, nada de muito concreto existe a respeito de sua etimologia. A fonte tradicional de Lénaion é lenós, "lagar", quer dizer, "tanque ou instalação, onde se espremiam as uvas para fabrico do vinho novo." 

 3º dia - Khytroi 


* Cozinhavam o multigrão (mix de sementes, trigo cozido oferecido em memória dos defuntos), que o dedicam a Hermes Ctônio, o condutor de almas. A tradição que explica o multigrão é que aqueles que se salvaram do Cataclisma de Deucalião, cozinhavam uma "panela de multigrão"
* No dia dos Khytroi acreditava-se que as almas retornavam ao mundo superno e tornavam-se invisíveis entre os vivos
* Acreditava-se ainda que entre as almas estavam presentes também espíritos maus que subiam à terra pela abertura do Hades e corrompiam as pessoas e os alimentos
* Colocava-se em volta dos santuários um fio vermelho que funcionava preventivamente e impedia os espíritos de ali penetrarem
* Também para impedirem que entrassem em suas casas, besuntavam as portas com alcatrão e mascavam bicos
* Expulsavam os espíritos maléficos do mundo ínfero, que em companhia das almas entrassem nas casas a partir da noite dos Khóes e ficassem com os vivos no dia dos Khytroi, com o seguinte dito: "Ide embora, almas dos defuntos, os Anthestéria já terminaram".
 


* As Hydrofória era uma festividade que ocorria no terceiro dia dos Anthestéria em memória daqueles que se afogaram no Cataclisma de Deucalião: "Hydrofória, festa fúnebre pelos Atenienses que pereceram no Cataclisma de Deucalião".
Durante essa festa jogavam pães de trigo e mel numa fenda que havia no templo de Zeus Olimpo, porque se acreditava que essa fenda da Terra absorvesse as águas do cataclisma.

Eis a descrição de BRANDÃO (1988, vol. II, 135-136) para o terceiro dia dos Anthestéria: 
"O terceiro dia intitulava-se Khytroi, "vasos de terracota, marmitas"... Os Khytroi são consagrados aos mortos e às Kêres: configuravam, portanto, um dia nefasto, uma vez que as Kêres (Aleto, Tisífone e Megera), "deusas dos mortos", são portadoras de influências maléficas do mundo ctônio. Por isso mesmo, logo pela manhã, se colhiam ramos com espinhos, cujo valor apotropaico é bem conhecido, e com eles todos se enfeitavam; as portas das casas eram pintadas com uma resina preta e todos os templos, exceto o Santuário de Lénaion, eram fechados. Orava-se pelos mortos, que, juntamente com a Kêres, vagavam pela cidade e, à tarde, oferecia-se a Hermes, deus psicopompo, uma panspermía, palavra composta de pân, "todo, total" e spérma, "semente", quer dizer, um tipo de sopa com mistura de todas as espécies de sementes. Da panspermia a pólis inteira participava em homenagem a seus mortos. 
Chegada a noite, todos gritavam: "Retirai-vos, Kêres, os Anthestéria terminaram".
Soa estranho que, em meio ao regozijo da festa do vinho novo, surjam os mortos e as Kêres, veículos de terríveis miasmas. É bom, todavia, não nos esquecermos de que Dioniso, sendo um deus da vegetação, como Deméter e Perséfone, dele depende também a próxima colheita. O hieròs gámos com a Basílinna, no dia anterior, e a panspermia têm toda uma conotação de fertilidade. Além do mais, as forças ctônias governam a fertilidade e as riquezas, de que, aliás, são os distribuidores. Não é por metáfora que o senhor do reino dos mortos se chamava Plutão, o rico por excelência, o qual, como se mostrou, é uma deformação de Pluto, a "própria riqueza". Num tratado, atribuído ao grande médico Hipócrates, lê-se: "É dos mortos que nos vêm os alimentos, os crescimentos e os germes." Os mortos sobem a este mundo em busca dos agradecimentos e dos sacrifícios (frutos, cereais, animais...), daquilo que eles mesmos proporcionaram aos vivos.
Para uma boa safra futura, um hieròs gámos, em que a semente (sperma) de Dioniso é colocada no seio da Basílinna, hipóstase daTerra-Mãe e, logo a seguir, uma panspermiapesavam muito no mundo dos vivos e dos mortos.
De qualquer forma, os Anthestéria eram a festa sagrada do vinho, quando, então, os participantes dos festejos, sagradamente embriagados, começavam a cantar e a dançar freneticamente, não raro à noite, à luz dos archotes, ao som das flautas e dos címbalos, até cair semidesfalecidos. É, neste estado, que algo de sério e grave acontecia, porque a embriaguez e a euforia, pondo-os em comunhão com o deus, antecipavam uma vida do além muito diversa daquela que, desde Homero até os grandes e patriarcais deuses olímpicos, lhes era oferecida. É que, através desse estado de semi-inconsciência, os adeptos de Dioniso acreditavam sair de si pelo processo do ékstasis, o êxtase. Esse sair de sisignificava uma superação da condição humana, uma ultrapassagem do métron, a descoberta de uma liberação total, a conquista de uma liberdade e de uma espontaneidade que os demais seres humanos não podiam experimentar. Evidentemente, essa superação da condição humana e essa liberdade, adquiridas através do ékstasis, consituíam,ipso facto, uma libertação de interditos, de tabus, de regulamentos e de convenções de ordem ética, política e social, o que explica, consoante Mircea Eliade, a adesão maciça das mulheres às festas de Dioniso. E, em Atenas, as coisas eram claras: nada mais reprimido e humilhado que a mulher. Dioniso e seusAnthestéria simbolizam a sua libertação. Não era em vão que, unindo-se à Basilinna, ele contraía núpcias com todas as mulheres dapólis de Atenas." 
Fonte das imagens e texto intitulado "AS RAÍZES DO CARNAVAL NA GRÉCIA ANTIGA" postado acima: 
http://archaia-ellada.blogspot.gr/2014/02/blog-post_7332.html

IV.  NOTAS

¹ Os Florais ou Jogos Florais (ludi Florales) eram outra festa dos antigos Romanos igualmente marcada pela liberdade e licenciosidade, dedicada a Flora, deusa das flores e plantas, ligada aos rituais de fertilidade. Esses festivais realizavam-se entre 28 de abril e 3 de maio, e incluíam a representação de mimos repletos de obscenidades.
²  Anthestéria (neutro plural); portanto, os Anthestéria (τα Ανθεστήρια). 
³  ανθέω=florescer; το ἄνθος=a flor
⁴  αναθέσσασθαι=revocar (as almas), trazendo-as de volta ao mundo 
⁵  Nota de BRANDÃO, J.S.: "Toda colheita era considerada um presente dos Deuses. Assim, enquanto não se fizesse uma consumação ritual e uma oferta das primícias aos imortais, para afastar quaisquer influências maléficas, a safra estava interditada, era tabu." 
⁶  A vinha, a hera, o tirso, a taça e as máscaras dionisíacas são os itens mais comumente encontrados nas festas, procissões e banquetes. O tirso era um bastão, todo enfeitado com hera (enrolada), cuja extremidade terminava por uma pinha, que os fiéis erguiam acima da cabeça, dançando. A vinha, a hera e o tirso são emblemas que se prendem ao fabrico do vinho, ou aos efeitos que ele produz. A hera tinha a propriedade de impedir a embriaguez e era, por isso, que, nos festins, os convivas com ela se coroavam e é com essa planta que a coroa de Dioniso é frequentemente representada. Ainda, em inúmeros lugares, a pinha entrava no fabrico do vinho, que devia diferir, em muitos aspectos, do que é hoje em dia. Os antigos misturavam-lhe mel e quase sempre água. Raríssimo era ver alguém sorver vinho puro.
⁷  βαλλισμός των κάρνων > καρναβάλι 

V.  BIBLIOGRAFIA
BRANDÃO, Junito de Souza: Dicionário mítico-etimológico da mitologia grega, Petrópolis: Editora Vozes, 1º volume: 701 p.; 2º volume, 559 p. 
BRANDÃO, Junito de Souza: Mitologia Grega, Petrópolis: Editora Vozes, 2ª edição, 1988, 1º volume: 404 p.; 2º volume: 323 p.; e 3º volume: 407 p.
LESSA, F.S. e BUSTAMANTE, R.M. (orgs.) et alii: Memória & Festa, Rio de Janeiro: Mauad Editora Ltda, 2005, 638 p., disponível na Internet inbooks.google.com.br/books?isbn=8574781789
FORTUNA, Marlene: Dioniso e a Comunicação na Hélade: o Mito, o Rito e a Ribalta, São Paulo: Annablume Editora, 298 p., disponível na Internet inbooks.google.com.br/books?isbn=8574194956

POSTADO POR 

***

CARNAVAL DE 1928 NA "PRINCEZA DO OESTE"
Por Francisco José dos Santos Braga

I.  INTRODUÇÃO

O que se verá abaixo é como transcorreram as festas dedicadas ao reinado de Momo na pacata cidade de São João del-Rei, em fevereiro de 1928.Em matéria anterior intitulada "Ranchos Carnavalescos de São João del-Rei em 1928/1929", publicada em 28 de fevereiro de 2014 no Blog de São João del-Rei,  apresentou-se-me o ensejo de mostrar, através de quatro textos, como funcionavam os ranchos carnavalescos de então, verificando a composição de sua diretoria, sua organização e como operava a gestão dessas sociedades carnavalescas existentes em 1928/1929 e que não perduraram até nossos dias.

Espero ter despertado a curiosidade de meus leitores para a  viva descrição dos festejos carnavalescos de São João del-Rei, nos idos de 1928, o que só foi possível concretizar com o presente texto. É com prazer que lhes ofereço o fruto de minha pesquisa atual, mediante a transcrição fiel de como era a diversão naquele carnaval de antigamente, fruída com muita alegria e satisfação por nomes representativos da sociedade são-joanense, como se verá.

A minha fonte de consulta foi o jornal "A Tribuna" no ano de 1928.

Para ser fiel ao redator/escritor dos referidos textos, observei rigorosamente a grafia de época.

II.  TEXTO DE "A TRIBUNA", DESCREVENDO O CARNAVAL DE 1928 EM SÃO JOÃO DEL-REI

CARNAVAL DE 1928 NA "PRINCEZA DO OESTE"

AS DIVERSÕES
 
Embora o primeiro dia do reinado de Momo não se revestisse, na nossa "Princeza do Oeste", de grande animação, — o enthusiasmo trazido pelo segundo e terceiro dias foi de molde a compensar completamente a fraqueza, aqui, do início dos folguedos.
Se a 19 do vigente o movimento de pedestres e de vehiculos acabou relativamente cedo, — a 20 e 21, comtudo, tal se não verificou, e a avenida Ruy Barbosa, centro dos prazeres, regorgitou de gente, e difficil era encontrar-se um automovel que já não estivesse de antemão contractado para o "corso", que se revestiu de aspecto deslumbrante.
O tradicional caracter ordeiro do povo sanjoannense fez com que as diversões decorressem sem attritos e dissenções que as perturbassem, e, a não ser um conflicto sem importancia, verificado no interior de um "café" local, durante um baile, nada nos consta que houvesse occupado a attenção das autoridades policiaes.
Seja-nos permittido destacar, a este ensejo, os serviços da guarda-civil deste municipio, que, inaugurando os seus uniformes, inaugurou tambem a sua acção publica. Auxiliando a inspectoria de vehiculos da edilidade, chefiada pelo sr. Rudini Bello, os membros da novel corporação esmeraram-se quanto puderam no cumprimento dos seus deveres.
 
O TEMPO
 
A chuva, que ameaçava cair desde sabbado, foi, felizmente, tombar longe destas paragens, e os tres dias "gordos" ostentaram physionomia e temperatura realmente magnificas.
O unico inconveniente disso resultante foi a poeira, que, aliás, mereceu decidido combate das mangueiras de agua da nossa Camara, por ordem do fiscal-geral, sr. João Assumpção.
 
O "CLUB X"
 
A veterana sociedade carnavalesca preoccupou-se em sair à liça honrando dignamente os seus fóros e os seus louros.
O seu prestito, bem organizado, causou esplendida impressão ao povo.
Foi o seguinte o conjunto do "Club X":
— Fanfarra de clarins.
— Commissão de frente, a cavallo, composta dos srs. Arthur dos Santos, José Paiva, João de Lima Osorio, tenente Eurico Barbosa, Alberto Reis e Olympio Ferreira Filho.
— Carro da directoria, conduzindo os srs. Carlos Guedes, major Americo Alvaro dos Santos e José Trindade.
— Banda de musica.
— Carro chefe, onde, em rico throno, sob artistico tecto sustentado por lindas columnas, se assentava uma formosa odalisca (a senhorinha Ilva de Oliveira), empunhando o estandarte do "Club X".
— Carro do moinho, allegorico e de movimento, ornamentado pela presença de formosas camponias hollandezas (senhorinhas Aura Nogueira, Martha Hilario, Elzy e Elsa de Oliveira e Carmen Chanaan).
— Carro japonez, com tres guardas-chuvas abertos sob o sol... da consagração e a chuva... dos applausos, e no qual representavam de graciosas "amarellas" as senhorinhas Sara Carvalho e Geralda Coelho.
— Carro da directoria, trazendo os srs. Antonio Augusto Pacheco, João Viegas Filho e Antonio Gomes de Oliveira.
— "Zé pereira"
Guardas de honra, fogos, etc., abrilhantaram o prestito.
Os carros foram confeccionados pelo habilidoso sr. Christovam Rodrigues da Silva, das officinas da E. F. Oeste de Minas.
Montaram as installações electricas o Dedéco e o sr. José Narciso.
A scenographia ficou a cargo do sr. Ernesto de Oliveira.

OS "RANCHOS"
 
Saindo à rua no primeiro e no terceiro dia, como o "Club X", os invenciveis "ranchos" da nossa terra conquistaram as mais vivas palmas e acclamações da multidão que enchia o centro urbano.
É, sem duvida, admiravel o esforço dos cidadãos que os compoem, e que se não desmente nos continuos triumphos pelos mesmos alcançados.
Sentimos que a escassez de espaço nos obrigue a restringir as notas a elles concernentes.
 
"UNIÃO DAS FLORES"
 
O rancho "União das Flores", que com modestia se intitula de "blóco", recebeu no sabbado gordo o seu estandarte, que esteve exposto na casa commercial do sr. Carlos Costa.
O seu prestito esteve assim constituido:
— Duas bellas meninas phantasiadas de "modestia".
— Balisa (sr. Pedro Costa).
— Porta estandarte (senhorinha Rosa).
— Coristas e pastoras.
— Conjuncto musical, sob a regencia do sr. Silvino de Siqueira, executando partituras harmoniosas, como as da "União das Flores" e da "Madrugada", ambas com letra de Benedicto dos Santos.
— Carrinho das flores, conduzindo encantadoras creanças.
 
"BOI GORDO"
 
O rancho "Boi Gordo" inspirou-se num difficil motivo historico, conseguindo, todavia, realizal-o com apuro, o que realça o valor do seu prestito: — Morrera o boi Apis de Memphis, o idolo, o "tabú" egypcio; era necessario substituil-o por outro, que ostentasse, como o extincto, as marcas divinas. E foi o episodio da sagração do boi Apis que o "Boi Gordo" apresentou ao povo, com o seu custoso carro e as suas personagens scintillantemente trajadas.
Eis a synthese do seu prestito:
— Fanfarra de clarins.
— Balisa.
— Porta estandarte, conduzindo precioso pendão, caprichosamente confeccionado.
— Grupos de meninas vestidas à egypcia e conduzindo flores, fructas, joias (offerendas ao idolo) e instrumentos musicaes da época.
— Carro da directoria, com os srs.: Fidelis Dilascio, presidente effectivo; Tarcilio Tolentino, vice-presidente; Avelino Guerra, bemfeitor; e José Felix, 2º secretario.
— "Fellahs", trazendo vasos com oleo perfumoso, para a uncção do novo boi Apis.
— Barbaçudo e veneravel sacerdote, rodeado de bronzeadas sacerdotizas.
— Fiéis e guerreiros.
— Banda de musica.
— Carro "Sagração do boi Apis", em que, no atrio do templo, — em que já se encontrava o animal divino, todo paramentado, — se via assentada a rainha de Memphis, Nephertite, na pessoa da prendada senhorinha Isabel.
O serviço de illuminação da primorosa obra, devida às mãos peritas do sr. Tarcilio Tolentino, — foi confiado ao sr. Waldemar Pugliese. A regencia do prestito esteve a cargo dos srs. Bernardino Coelho e Domingos do Sacramento.

"CUSTA, MAS VAE" 
"Era uma noite astral de primavera,
Noite aromal, de rustica pureza,
E tão cheia de luz, que se dissera
Ser a festa natal da natureza"... 
O prestito do "Custa, mas vae" estava formado assim:
— Fanfarra de clarins.
— Presidente e secretario, a cavallo.
— Porta estandarte, senhorinha Albertina Nunes, e seu defensor. O pavilhão foi preparado pela senhorinha Laura Lopes de Oliveira e pintado pela senhorinha Filhinha Ramalho.
— 36 moças e 22 rapazes, representando constellações, estrellas isoladas, planetas, etc.
— Banda de música.
— Carro "Dentro da noite", em que figuravam o Cruzeiro do Sul, o crescente lunar e uma engenhosa estrella de movimento. Sobre uma nuvem e sob a chuva de estrellas do firmamento, tres jovens e pulcherrimas estrellas humanas, astros vivos de belleza, sorriam ao povo. Foi trabalhado pelo sr. Nico Raposo, conhecido artista sanjoannense.
As canções do "Custa, mas vae", a toada musical, as evoluções choreographicas se mostraram, em verdade, magistraes.
Directoria: sr. Miguel Lopes, sr. Zenone Rosseto e sargento Benedicto Lopes; regente da orchestra, sr. Antonio Candido Bastos; ensaiador, o folião Liberato.
 
"QUALQUER NOME SERVE"
 
O "Qualquer nome serve" escolheu um motivo japonez, apesar da China, alli perto, estar em conflagração. Mas não houve perigo: os seus japonezes não se metteram na "encrenca"; foram os mais pacatos deste mundo, pois nem do opio fizeram uso, servindo, unicamente, para deliciar o povo cá da terra. Completamente incapazes de um "harakiri"...
Da gruta do Bomfim, saiu o prestito, alinhado desta forma, para percorrer o coração da cidade:
— Fanfarra de clarins.
—  Balisa (sr. Antonio Rosa).
— Porta estandarte (senhorinha Maria da Gloria). O estandarte, que esteve exposto na vitrina do "Cachimbo Turco", foi decorado pelo eximio pincel da senhorinha Aida Fazanelli e teve como padrinhos o sr. Gumercindo Gomes e a senhorinha Juracy Coelho.
— Carro da directoria, em que vinham os srs. Dermeval Senna, Waldemar Gomes, poeta Jorge Brandão (de oculos escuros, sorridente e declamando em secco), Abner Coelho, Farnese Silva, José Franco (de calva à mostra) e Waldemar de Freitas.
— Guarda de honra, a cavallo (srs. Lindolfo José de Freitas e Josino Silva).
— 60 moças e moços, à japoneza.
— Banda de musica, regida pelo maestro Columbiano.
— Carro "Pagode japonez", em que quatro graciosas creanças, vestidas a caracter, circumdavam o altar do deus Buddha. Foi construido pelo sr. Francisco Vieira, auxiliado pelos srs. José Lucio da Costa e José Adriano Esteves.
Canções: "Qualquer nome serve", de Egroj e José Lino; "De fogo", de lord Cunha; "Vamos! vamos!", de lord Columbiano; "Ella não me quer", de lord Gotteira; "Sabiá mimoso" e "Pião", cariocas e offerecidas pelo sr. Recemvindo dos Santos; "Japonezes", de Egroj e lord Columbiano; "Minas F. C.", de Egroj e J. Japhet.

BLOCOS 

Foi coroado de magnifico exito o excellente e folgazão "Blóco Preto e Branco", constiuido de elementos representativos do nosso escol social e onde conseguimos annotar, tomando parte nos corsos de domingo, segunda e terça-feira gorda, em vistoso caminhão primorosamente ornamentado, as formosas senhorinhas Lulú Pacheco, Dulce Pacheco Faleiro, Hilda, Judith, Zilah e Juracy Guimarães, Lais e Clelia Moura Brasil, Neréa e Jandyra, Judith Baptista, Dulce e Alice Guedes, Maria Esther e Laura Pereira da Silva, Oscary e Nitinha Sousa, e Naná Guimarães.
O "Blóco da interrogação" esteve presidido pela exma. familia do estimado commerciante nesta praça sr. Aniceto Antunes; saiu em caminhão muito chic, entoando lindas canções.
O "Blóco do Oh! fa, la, si, mi amas"... foi chefiado pelo distincto moço sr. Ivan de Andrade Reis, auxiliado pelos destemidos foliões carnavalescos srs. Jorge Mourão, Zico Marchetti, Edgard Guedes, Amadeu Martins, Rubens Albergaria, Eurico Ferreira, Cid Rangel, Jorge Rodrigues, Olympio Ferreira, Paulo Christofaro e Aloysio Moura Brasil; todos representantes da sociedade "Guttemberg" e nossos confrades de imprensa.
Os "Turunas", orientados pelo "principe" sr. Eduardo Cancio, alcançaram um successo digno de applausos, e façamos justiça aos destemidos representantes da folia, os eximios musicistas srs. Francisco da Conceição Alves, José Andrade dos Santos, José Valentim, José Salles, José do Espirito Santo, Ordalis Ferreira, Henrique do Carmo, Olavo Silva, Noel e Paulo Baptista Lopes, Oscar Gonçalves, João Salles e Alcides de Paula Coelho, em vistosa phantasia de "rajah".
O "Blóco do Zero" esteve simplesmente adoravel, na sua interessante originalidade.
O Oscar Pereira "da collectoria" arranjou um "Blóco do Eu sosinho", que esteve muito quixotesco.
O "Blóco da Cruz Vermelha" esteve lindo; nelle se nos depararam o "doutor de facto", dr. Alencar de Carvalho, o academico José de Almeida Neves e, na tolda do automovel, as encantadoras e distinctas enfermeiras, normalistas, Maria e Hildegarda Alvares, Ruth e Haydée Resende de Carvalho.
O "Blóco da Alegria", já afamado nesta "urbs", foi muito feliz na sua harmoniosa "charanga", e convem apresentar nossos cumprimentos aos distinctos jovens, srs. Francisco Eugenio, João Vicente Zêza, Jayme Vieira, Guilherme Athayde, João Trindade e Antonio Carlos.
 
PHANTASIAS
 
Conseguimos apreciar um elemento feminino da alta sociedade sanjoannense, no "footing" da avenida Ruy Barbosa, trajando ricas e vistosas phantasias e, ao começarmos nossas annotações, vimos a formosa senhorinha Maria da Conceição Alves, elegantemente ostentando linda phantasia de mexicana, que, na nossa opinião e de diversas pessoas de destaque da cidade, é merecedora de francos e sinceros applausos.
Apreciamos, mais, a graciosa senhorinha Donalda Pereira Lima, ricamente phantasiada de "dama espanhola" e, quem a visse, tinha a impressão de que aquella sevilhana já estava preparada para assistir às grandes "touradas". Não perdeu o seu tempo, pois, si não houve "tourada", ocorreu, sim, a "sagração do boi Apis".
As formosas senhorinhas da "Princeza do Oeste" fizeram tudo para que o carnaval deste anno fosse majestoso; e, é um facto, emprestaram o seu concurso, com garbo, aos bailes à phantasia e aos passeios da avenida, as seguintes, ricamente phantasiadas: Hilda Monteiro, Jenny Borlido, Juracy Guimarães e Alice Guedes, de espanholas; Judith Guimarães, bailarina mexicana; Maria do Carmo Braga, "Fanal"; Dulce Soares, futurista; Carmen Barros, hollandeza; Nair Lamounier, cigana; Norma Daldegan, ba-ta-clan; Alzira Salomão, beduina; Malvina Tobias, melindrosa; Lulú Pacheco, bailarina; Hilda Guimarães, "pierrette"; Zilah e Naná Guimarães, dansarinas gregas; Dulce Pacheco Faleiro, bailarina; Dulce Guedes, dama antiga; Lais Moura Brasil, mexicana; senhorinhas Neréa, de pastora, e Clelia, de primavera; Jesuina Marinho, de futurista; Margarida Rio Grande, bahiana; Mercedes Mourão, garota; Maria Luisa Vieira de Castro, pirata; Regina Yunes, "pierrette" futurista; Heloisa Pimentel, de Maria Antonieta; Margarida Pimentel, dama veneziana; Luisa Azevedo, futurista; Odette Horta, hawaiana; Beatriz Albergaria, de dama antiga; Maria Sbampato e Maria Luisa Pereira, "pierrettes"; Nitinha Sousa, hawaiana; Amelia e Eunice Rodrigues, futuristas; Ilva de Oliveira, de odalisca; Jujú Cirne e Cleonice Bello, "pierrettes"; Cleusair e Ivonne Monteiro, camponezas; Antonieta Ribeiro da Silva, de crysanthemo; Hilda Rangel, de futurista.
Àquella que, porventura haja escapado à nossa reportagem, pedimos desculpas, pois não vem ao caso nenhum resentimento, visto como o accumulo de pessoas muitos nos prejudicou.
 
NOTAS
 
Foram vendidas pelas importantes casas commerciaes Castanheira & Gomes, J. Bellini & Comp., José Sade e pelo sr. Zenone Rozzetto 530 duzias de lança perfumes, não se mencionando aqui as que foram vendidas pelos srs. Armando Cunha, Vasques de Miranda, A. José Machado e Godinho.
 
JULGAMENTO
 
Sabemos que está sendo devidamente organizada uma commissão de empregados do commercio, que decidirá qual dos quatro ranchos apparecidos em scena foi o vencedor, no carnaval do presente anno. Ao victorioso conferir-se-á linda taça, que se acha exposta na vitrina do café "Rio de Janeiro".
Assim sendo, aguardamos o laudo da referida commissão, reservando-nos o direito de critical-o, caso as conclusões do mesmo não nos pareçam justas e coherentes.
 
Fonte: A TRIBUNA, Anno XIV, São João del-Rey, 26 de fevereiro de 1928, nº 917

III.  AGRADECIMENTO E CONCLAMAÇÃO

Gostaria de deixar registrado aqui o meu agradecimento à equipe de trabalho da Biblioteca Batista Caetano de Almeida pela presteza no atendimento e pela custódia de periódicos de época. Constatei, entretanto, que o acondicionamento de tais periódicos está deixando a desejar,  não sendo suficientes as dotações consignadas no orçamento municipal para a preservação, desinfecção e digitalização do material catalogado, a fim de evitar o desnecessário manuseio e consequente danificação do que ainda resta. Ao mesmo tempo, a Lei Federal nº 10.753, de 30 de outubro de 2003, que institui a Política Nacional do Livro, pode ajudar muito a melhorar as difíceis condições em que a biblioteca pública são-joanense se encontra. No artigo 16 da referida lei, prevê-se que "a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios consignarão, em seus respectivos orçamentos, verbas às bibliotecas para sua manutenção e aquisição de livros." Como a dotação orçamentária municipal não tem sido suficiente para bibliotecas de certa complexidade como a Biblioteca Batista Caetano de Almeida (inaugurada em 1827!), esta vetusta instituição depende de subvenções governamentais das três esferas de governo para que possa continuar prestando serviços de qualidade a seus pesquisadores e usuários, dependendo de parlamentares e governantes patriotas dispostos a consignar verbas nos respectivos orçamentos para a continuidade e melhoria de sua prestação de serviços sociais especializados.

POSTADO POR 

***

RANCHOS CARNAVALESCOS DE SÃO JOÃO DEL-REI EM 1928/1929
Por Francisco José dos Santos Braga

I.  INTRODUÇÃO

Mikhail Bakhtin escreveu em 1940 um livro intitulado "A Obra de François Rabelais e a Cultura Popular na Idade Média e no Renascimento", que só foi publicado em 1965. Aí ele desenvolveu uma inovadora teoria da cultura popular e da sua apropriação pela literatura, com base nos conceitos de carnaval e carnavalização. Carnaval para ele não se referia apenas ao período antes da Quaresma, mas compreendia determinadas festividades que, durante a Idade Média e o Renascimento, transcorriam noutros momentos do ano associados a festividades sacras e chegavam a totalizar cerca de três meses. As suas origens remontam certamente aos cultos dos mortos e rituais propiciatórios e celebratórios de comunidades agrícolas primitivas que ocorriam durante o tempo das colheitas. Na Roma antiga tinham lugar em dezembro as festas em honra ao deus Saturno, conhecidas como Saturnalia. À semelhança do mundo às "avessas do Carnaval", as Saturnalia se caracterizavam pela vivência diária da inversão da ordem social normal, quando então os escravos tomavam o lugar dos senhores e entregavam-se a toda a espécie de prazeres habitualmente proibidos. 

Para Bakhtin, o Carnaval constituía simultaneamente um conjunto de manifestações da cultura popular e um princípio de compreensão holística dessa cultura. Na perspectiva bakhtiniana, o elemento que unificava a diversidade das manifestações carnavalescas era o riso e lhes conferia a dimensão cósmica: um riso coletivo que se opõe ao tom sério e à solenidade repressiva da cultura oficial e do poder real e eclesiástico. O riso carnavalesco como entidade livre prosperou em espetáculos e rituais cômicos (cuja característica era a sua natureza não oficial, configurando, como diz Bakhtin, uma segunda vida do povo, um duplo das práticas da Igreja e do Estado, em que todo o povo participava , numa comunhão utópica de liberdade e abundância, de suspensão de todas as hierarquias e de dissolução da fronteira entre a arte e o mundo —, aspectos que eram encontrados por exemplo na "festa dos loucos" ou na "festa do burro", na Europa), nas composições literárias cômicas (por exemplo, a paródia sacra) e, por fim, na utilização de termos profanos, blasfêmias, obscenidades e expressões de insulto. Outros aspectos do universo do Carnaval são igualmente dignos de nota: a representação carnavalesca do corpo, a que Bakhtin chama realismo grotesco, centrada no "baixo corporal" (a boca, a barriga, os órgãos genitais); o uso da máscara simbolizando o triunfo da alteridade durante aquele tempo convencionalmente reservado à transgressão; e, por fim, a relativização da verdade e do poder dominantes, presentes no período do Carnaval, celebrando a mudança e a renovação do mundo. ¹
 
No mundo contemporâneo, pode-se observar muitas práticas culturais afins ao carnavalesco, tais como o espetáculo teatral, a pintura, o cartoon, o grafite, a publicidade, etc., tendo infiltrado até nos nossos Poderes da República, sem excluir nenhum, perpassados que se encontram por certo espírito momesco. Também os meios de comunicação se têm deixado carnavalizar, na medida em que "houve uma explosão com Bakhtin, tudo começou a se carnavalizar, e generalizou-se o conceito de paródia para qualquer discurso que não fosse absolutamente objetivo, e, como nenhum discurso é absolutamente objetivo, todos os discursos pareceram paródicos." ²
 
No presente trabalho, transcrevo para os leitores quatro textos, não propriamente sobre festejos carnavalescos de São João del-Rei, mas versando sobre a composição da diretoria, organização e gestão das sociedades carnavalescas ("ranchos carnavalescos") que existiam em 1928/1929 e que não perduraram até nossos dias. Podemos ver, trabalhando no seio desses ranchos carnavalescos e lutando pelo bom êxito das festividades momescas, nomes emblemáticos da sociedade são-joanense.
 
A minha fonte de consulta foi o jornal "A Tribuna" no período considerado.
 
Para ser fiel ao redator/escritor dos referidos textos, observei rigorosamente a grafia de época.
 

II.  AMOSTRA DE TEXTOS REFERENTES A ALGUNS RANCHOS CARNAVALESCOS "DE ANTIGAMENTE"

1.  CLUB X

S. João del-Rey, 20 de novembro de 1928.
Exmo. sr. redactor da "Tribuna",
Tenho a elevada honra de participar a v. ex. que, em assemblea geral, realizada a 16 do corrente mez, na séde da Associação Commercial, foi eleita, para gerir os destinos do Club X (sociedade carnavalesca), durante o periodo de 1928-1929, a seguinte directoria:
Presidente honorario, José de Carvalho Resende; 1º vice-presidente honorario, Josino Martins; 2º vice-presidente honorario, Joaquim Portugal; presidente effectivo, Carlos Guedes (reeleito); 1º vice-presidente, major Americo A. dos Santos (reeleito); 2º vice-presidente, João Baptista Rodrigues; 1º secretario, João Viegas Filho; 2º secretario, Nicoláo Dilascio; 1º thesoureiro, J. Bellini dos Santos (reeleito); 2º thesoureiro, João Assumpção; 1º procurador, Antonio Gomes de Almeida (reeleito); 2º procurador, Zenone Rozzetto; 3º procurador, Joaquim Roque Teixeira.
 
Na mesma assembléa foram acclamadas madrinhas do Club as exmas. mmes. Antonio Ottoni Sobrinho, João Reis, Gumercindo Gomes, Raul Trindade, Benevides de Carvalho, Simões Coelho, João de Castro e Oscar da Cunha.
 
Foram tambem escolhidos unanimemente para chefe do Barracão, Scenographo e Electricista, respectivamente, os srs. Chistovam Rodrigues da Silva, Ernesto de Oliveira e José Narciso da Silva.
 
Servimos do ensejo para apresentar-lhes os nossos protestos de particular estima e subida consideração.
João Viegas Filho
1º Secretario

 Fonte: A Tribuna, São João del-Rei, Anno XIV, nº 954, de 25 de novembro de 1928
 
2. Rancho Carnavalesco BOI GORDO
 
Da directoria do rancho carnavalesco "Boi Gordo", recebemos o seguinte officio:
São João del-Rey, 11 de março de 1929.
Exmo. sr. redactor de "A Tribuna".
Cidade.
Tenho a subida honra de communicar-vos que em Assembléa Geral Ordinaria do rancho carnavalesco "Boi Gordo", realizada a 26 do passado, foi por unanimidade eleita a nova Directoria, que terá de dirigir os destinos deste rancho, no periodo de 1929 a 1930 e que ficou assim constituída:
DIRECTORIA
Presidentes honorarios, cel. Alberto de Almeida Magalhães e cel. Carlos Guedes; Presidentes de honra, cel. Antonio Balbino de Sousa e cap. José Bini; vice-presidentes honorarios, dr. Romualdo Cançado e cel. Manuel Soares de Azevedo; vice-presidentes de honra, srs. Delphino Castanheira e João Lobosque de José; paranymphos do estandarte, sr. Octavio Neves e senhorinha Regina Yunes; paranymphos do carro, srs. João Baptista da Costa, Luiz Baccarini, João Lombardi e João Baptista Rodrigues; paranymphas do carro, madames Carlos Albero (?) Alves e Flavio Cicero; senhorinhas Iracema Baccarini e Aura Lobosque; bemfeitor do rancho, cel. Joaquim Miranda; bemfeitora do rancho, sra. Maria Eulalia Guerra (reeleita); benemerito do rancho, o fundador sr. Fausto de Almeida; benemeritas do rancho, sras. Hilda Coelho e Carminda Silva Teixeira; presidente effectivo, cap. Avelino Guerra (reeleito); 1º vice-presidente effectivo, tenente Cyrillo Carlos Ferreira; 2º vice-presidente effectivo, Agnello Tolentino (reeleito); 1º secretario, Fidelis Dilascio; 2º secretario, Domingos do Sacramento; 1º thesoureiro, Tharcillo Tolentino; 2º thesoureiro, Bernardino Coelho (reeleito); 1º procurador, Armando de Freitas (reeleito); 2º procurador, Epaminondas Floriano (reeleito); procuradoras, senhorinhas Maria das Dores, Carmelita de Andrade e Maria Cyrillo; orador official, Plinio Campos da Silva (reeleito); fiscal e mestre de sala, José das Chagas Teixeira; director do barracão, Waldemar Pulheiz (reeleito).
 
Sirvo-me do ensejo que se me apresenta, para patentear-vos, em nome do rancho carnavalesco "Boi Gordo", todo o meu elevado apreço e distincta consideração. 
Fidelis Dilascio
1º secretario interino
 
Fonte: A Tribuna, São João del-Rei, Anno XV, nº 970.
 
3) Rancho Boi Gordo
 
Effectuou-se a 30 do mez passado, com solennidade, em sua luxuosa séde social, sita à rua de Santo Antonio, 28  ³, às 21 horas, a posse dos novos timoneiros para o periodo de 1929 a 1930 do garboso rancho Boi Gordo.
 
O programma foi o seguinte: — Sessão presidida pelo tenente Farnese Silva, distincto presidente da sympathica aggremiação carnavalesca desta cidade "Qualquer nome serve".
 
Leitura da acta da sessão passada pelo sr. Fidelis Dilascio.
 
Posse do novo presidente, capitão Avelino Guerra que empossou, debaixo de calorosa salva de palmas da numerosa assistencia, os demais directores do "leader" dos ranchos da "Princeza do Oeste".
 
Entrega de um delicado mimo pelo nosso redactor e seu brilhante confrade sr. Agostinho Azevedo, em nome do alto representante do commercio local sr. Alfredo Mauro, activo proprietario do antigo e conceituado café "Rio de Janeiro", de uma rica estatueta symbolizando — Honra ao merito.
 
Discursaram o nosso redactor e seu collega o vibrante tribuno sanjoannense sr. Agostinho Azevedo, que receberam os agradecimentos dos directores do Boi Gordo, capitão Avelino Guerra e Fidelis Dilascio, em formosos improvisos.
 
Terminada a sessão, foi servida uma mesa primorosamente ornamentada de flores naturaes, doces e bebidas, e forma erguidos enthusiasticos brindes pelos srs. orador official do Boi Gordo, tenente Farnese Silva, Ignacio Loyola de Almeida, tenente Cyrillo Carlos Ferreira, Fidelis Dilascio e Agostinho Azevedo.
 
Os srs. tte. Farnese Silva, Ignacio Loyola de Almeida e Lindolpho de Freitas, garbosos membros da incasavel directoria do rancho "Qualquer nome serve", estiveram presentes à festa e receberam, por parte dos seus co-irmãos de luctas, carinhosas e significativas demonstrações de estima.
 
A ornamentação da séde, a cargo do tte. Cyrillo Carlos Ferreira, foi deslumbrante.
 
Annotámos, com vivo prazer, a gentileza da directoria do Boi Gordo, collocando bellissimos escudos à imprensa, Camara e commercio locaes.
 
Tocou a jazz band do 11 R. I. e as danças, animadissimas, prolongaram-se até à madrugada, comparecendo à festividade muitos associados, exmas familias e representantes de varias classes sociaes.
Agradecemos ao Boi Gordo o gentil convite para assistirmos à solenne posse de sua novel directoria.
(Redação de "A Tribuna")

4)  Rancho carnavalesco QUALQUER NOME SERVE
 
S. João del-Rey, 26 de março de 1929.
Ilmo. e exmo. sr. redactor da "A Tribuna".
Cidade.
Tenho o immenso prazer de levar ao conhecimento de v. ex. que, em assembléa geral, realizada a 22 do corrente mez, em a séde social desta aggremiação, foi unanimemente eleita a Directoria abaixo para gerir os destinos deste rancho, no periodo de 1929 a 1930. Certo de que, nos futuros festejos carnavalescos, muito honrará esta modesta aggremiação, que conta com o valioso concurso de v. ex., a vossa honrosa presença em todos os actos internos, antecipo-vos sinceros agradecimentos. A Directoria é a seguinte:
Rainha, senhorinha Aida Fazanelli; presidentes de honra, sr. dr. José Francisco Bias Fortes e capitães João Narcizo de Sá, Carlos Alberto Alves e José Resende de Andrade; vices presidentes de honra, srs. Alfredo Mauro, João Carlos Rosa, José de Sant'Anna Neves e Avelino Andrade; presidentes honorarios, poeta J. Brandão e Manuel de Freitas, fundadores do rancho; presidentes benemeritos, srs. Ernesto de Oliveira, Waldemar Gomes e cap. Dermeval Senna; paranymphos do estandarte, cap. José Bini, srs. Miguel Lopes e Carlos Ladeira; paranymphas do estandarte, exma. sra. d. Maria das Dores Ferreira e senhorinhas Mercês Bini e Germana Viegas; paranymphos do prestito, cel. Antonio Balbino de Sousa, major Emygdio de Moraes, srs. José Amaro do Carmo e João Balbino do Nascimento; paranymphas do prestito, exma. sra. d. Gabriela Martins de Andrade Reis, senhorinhas Helena Daldegan, Anna Mourão e Beatriz Pimenta; bemfeitoras do rancho, exmas. sras. Maria Euflauzina de Freitas, Celina dos Santos, Maria Balbina e senhorinha Guiomar A. da Costa.
DIRECTORIA ACTIVA
Presidente, tte. Farnese Silva (reeleito); 1º vice-presidente, José Adriano Esteves; 2º vice-presidente, Waldemar de Freitas; 1º secretario, Ignacio Loyola Q. de Almeida (reeleito); 2º secretario, Geraldo C. Guimarães (reeleito); 1º thesoureiro, Lindolpho José de Freitas (reeleito); 2º thesoureiro, Josino L. da Silva (reeleito); 1º procurador, Antonio de Sant'Anna; 2º procurador, Carlos J. Lima; 1º orador official, José Franco da Fonseca (reeleito); 2º orador official, senhorinha Alice da Costa; director technico, Francisco Vieira (reeleito); auxiliares technicos, José Nicolau da Costa e Bento Vieira (reeleitos); directores e ensaiadores, José Santiago e Nestor d'Annunciação (reeleitos); fiscal interno, Sertorio Gonçalves; fiscal geral, José Lucio da Costa (reeleito); porteiro, Juvenal dos Santos (reeleito).
 
Solicitando a honra de vossa resposta, valho-me do ensejo que se me apresenta, para hypothecar a v. ex., o mais alto grau de minha respeitosa consideração.
Ignacio Loyola Q. de Almeida
1º secretario
 
Fonte: A Tribuna, São João del-Rei, Anno XV, nº 973.

III.  NOTAS DO AUTOR

¹ Cf. verbete "Carnavalização", no E-Dicionário de Termos Literários de Carlos Ceia, no seguinte link: http://www.edtl.com.pt/?option=com_mtree&task=viewlink&link_id=602&Itemid=2 
²  SARLO, Beatriz: "Paisagens imaginárias", São Paulo: Edusp, edição de 2005, p. 98.
³  Devido a uma provável reenumeração ocorrida ao longo do tempo, fica muito difícil identificar o nº 28 da Rua Santo Antônio nos dias atuais. Na realidade, trata-se do sobrado que pertenceu a meu avô José da Silva Braga ("Nhonhô" Braga), até hoje propriedade de nossa família, situado no atual nº 136 da referida rua. Antes de ser a sede do "Boi Gordo", esse sobrado funcionou como Externato do Professor Travanca, famigerado por sua extrema severidade.
 
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