a cidade com que sonhamos é a cidade que podemos construir

la ciudad que soñamos es la ciudad que podemos construir

the city we dream of is the one we can build ourselves

la cittá che sognamo é la cittá che possiamo costruire

la ville dont on rêve c’est celle que nous pouvons construire

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Escopo: São João del-Rei | Tiradentes | Ouro Preto | Minas Gerais | Brasil | Mundo

 

Na Curva do Tempo . Otto Lara Resende

Descrição

“Tem horas antigas que ficaram muito mais perto da gente do que outras, de recente data.” João Guimarães Rosa.

Leio que desapareceu o arquivo do fotógrafo André Bello. Este nome de artista pode não significar nada para quem viu a notícia e o apelo no jornal. Para mim, é mais do que uma notícia; é uma viagem ao princípio dos tempos, a um certo sobrado da Praça dos Andradas, em São João del-Rei, ali onde morava, com a sua família, uma das minhas colegas de colégio. Com o arquivo de André Bello, imagino que se tenham perdido, e que logo se reencontrem, muitas imagens de São João del-Rei, de suas ruas e de sua gente, de seus largos e de suas igrejas, do tempo em que a rua São Francisco de Assis tinha o mais longo correr de sobrados barrocos do mundo. Perdeu-se também a foto de muitos meninos, e entre eles, estou eu, remotíssimo, olhos espantados a encarar o futuro.
Não é agradável o cacoete saudosista, sobretudo se invocado para maldizer os dias de hoje. Mas há coisas que fazem falta. Como a bela coleção de retratos de André Bello. Ou coisas menos concretas e nem por isto menos preciosas. Ontem foi dia da República. A República é inseparável da cidadania. E na cidadania assenta o conceito democrático da igualdade. Depois de tantos anos, desde 1965, perdeu-se entre nós o caminho das eleições diretas, a não se para um Congresso coagido e umas Assembléias tuteladas pelo arbítrio. Pois agora vamos voltar ao princípio republicano da escolha direta de governadores. Esperamos que volte breve também o voto para presidente, como deseja o Brasil, segundo pesquisa recente do Instituto Gallup.
Por falar em retorno, passou agora dia 11 o 25º aniversário do golpe, ou contradente de Moraes, neto, empenhou até a exaustão o seu arsenal jornalístico-jurídico. Prudente glosou com sarcasmo a expressão “restrição mental”, que apareceu na entrevista de Lott, mas que Lott não pronunciou. A entrevista foi feita por mim e recorri à expressão jesuítica como eufemismo, no seguinte trecho: “Confesso que fui obrigado, senão a uma mentira, pelo menos a uma restrição mental”.
Deste mesmo corrente mês de novembro é também o dia 10, que lembra o golpe de Estado de 1937. Sobre apócrifo Plano Cohen, O GLOBO publicou domingo passado matéria que mostra como se pode golpear as instituições constitucionais com o pretexto montado numa descarada mentira. Em matéria de novembro, prefiro por isto mesmo viajar para outro, mais antigo, de 1877, quando se fez a Lei Provincial que tornou possível a construção de uma estrada de ferro prevista noutra lei, de 1872. Seguindo até o Vale do Rio das Mortes e demandando o Rio Grande, pelo lado Oeste, aí está no nascedouro a saudosa Estrada de Ferro Oeste de minas, que tinha sede em São João del-Rei. Há de ver que no arquivo de André Bello existem lindas fotos da maria-fumaça que valentemente primeiro chegou até o Lenheiro. O povo de São João não apenas desejou a sua ferrovia como se cotizou para arrecadar os fundos necessários à sua construção. Gente pobre, dizem que até lavadeiras ajudaram a construir a estrada. Em 1881, Dom Pedro II desceu do trem com a sua comitiva. O vagão do imperador ficou histórico. Pois agora o vagão e a locomotiva foram levados para Belo Horizonte.

Fonte: O Globo 16/11/80
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