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Tipo: Artigos | Cartilhas | Livros | Teses e Monografias | Pesquisas | Lideranças e Mecenas | Diversos
Escopo: São João del-Rei | Tiradentes | Ouro Preto | Minas Gerais | Brasil | Mundo
Uma questão de competência . Oyama de Alencar Ramalho
Descrição
Vai aqui um assunto interessante para reflexões variadas. Pelo fato de ter acontecido um com amigo, devo dizer que não estou aproveitando deste espaço jornalístico para abordar um assunto de reduzido interesse pessoal. Muito mais importante é o assunto geral, e por ser do âmbito da administração pública, interessa à comunidade regional de São João del-Rei, ao Estado de Minas Gerais e ao País.
Recebeu o meu amigo um ofício cheio de siglas e números; como diria O Sargento Getúlio, um monarquismo de documento: GAB/13ª CR/IPHAN-MG/Nº 534/97, dizendo que ele é possuidor de imóvel tombado pelo Poder Púbico Federal e considerando isso mais aquilo, está notificado para que no prazo de 15 dias deverá fazer um serviço emergencial do escoramento e apresentar, no prazo de 60 dias, projeto de restauração total do imóvel. E termina com a ameaça: “O não atendimento a esta NOTIFICAÇÃO acarretará medidas judiciais cabíveis, o que ensejará maiores ônus. Cordialmente, Maria Machado Rangel – Coordenadora Regional Substituta da 13ª CR/IPHAN.”.
A impressão dada pelo documento é semelhante à de estarmos em Londres, Berlim, Paris ou Viena, um pouquinho mais adiantados. Parece que moramos numa cidade onde todos os problemas do chamado Patrimônio Histórico estão resolvidos e que agora alguns cidadãos relapsos têm que ser ameaçados a fim de que seus imóveis sejam restaurados de modo quase integrem na “harmoniosa” paisagem arquitetônica da cidade. É neste ponto que não entendemos a questão. Por que fazer tais exigências diante das lastimáveis situações em que se encontram alguns monumentos, alguns próprios públicos e outras peças históricas como as obras raras da Biblioteca Batista Caetano de Almeida? Que força moral tem algum órgão público para exigir providências individualizadas dessa natureza quando a situação do tombamento dos imóveis históricos desta cidade é algo que merece uma investigação séria, por um lado, e um ajuste definitivo, por outro lado. Digo isso porque tenho em mãos uma certidão emitida pela Secretaria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional a qual gera dúvidas muito sérias sobre o ato jurídico do tombamento ocorrido em de São João del-Rei e, sendo assim, como vamos acreditar num órgão cujo trabalho está embassado num ato jurídico suspeito? Em primeiro lugar os imóveis estão inscritos no livro de Belas Artes e não no livro de Tombo Histórico, conforme preceitua o Inciso 2º do Artigo 4º do próprio Decreto-Lei 25/37. Em segundo lugar, como vamos acreditar num tombamento ocorrido em 1938, baseado numa planta da cidade de 1944? É bom ainda prestar atenção que o documento cita a praça Frei Orlando e, como todos sabem, Frei Orlando virou nome de praça em 26 de dezembro de 1945, conforme noticia o são-joanense Sebastião de Oliveira Cintra, um historiador digno de inteira confiança. (Galeria das Personalidade Notáveis de São João del-rei, p.232).
Estamos pois diante de uma verdadeira mágica: o tombamento do patrimônio arquitetônico de São João del-Rei foi feito de ofício, englobando patrimônios públicos e privados, em 1938, tendo por base fatos futuros de 1944 e 1945.
Voltando ao caso do meu amigo, de imediato, descarto a possibilidade de uma maldosa e deliberada perseguição pessoal que não faz sentido nestes amenos e lisos tempos de liberdade democrática. Os zelosos funcionários do IPHAN, na ausência de novidades importantes, devem estar simplesmente cumprindo os mandamentos do Decreto-Lei nº25/37, um dispositivo legal do tempo do Estado Novo que facilmente coloca o proprietário particular em situações constrangedoras, o que nos faz interrogar.
-Onde estavam os funcionários guardiões desse decreto quando destruíram a Avenida Rui Barbosa, a Rua Direita, a Rua do Comércio, a Rua Municipal? É bem verdade que os prédios destruídos foram substituídos por obras muito bem escoradas no concreto armado, projetadas e aceitas por pessoas cujos cérebros deveriam ser constituídos de massa cinzenta de puro cimento. Onde estavam os funcionários quando destruíram a igreja do Senhor Bom Jesus de Matosinhos? E vai por aí afora. E neste momento, será que os atuais zelosos guardiões do decreto-lei estão atentos à destruição do Chafariz da Legalidade? (Tardiamente estão lá, fazendo alguma coisa, e espero que não seja uma cerca de galinheiro como a que prendeu o Dr. Augusto Viegas por muitos anos). Estarão atentos às telhas de amianto na casa do Barão de Itambé e numa construção modernosa na praça da matriz de Resende Costa? E agora, que dizer das feias barracas dos camelôs? Que dizer de outras horrendas barracas que já têm até alicerce, que não só atravancam o caminhar dos transeuntes, bem como e sobretudo, são um péssimo e agressivo fator de poluição visual numa cidade da qual se diz ser possuidora de potencial turístico? Será que o projeto do governo federal já está contemplando a privatização das ruas e praças, na base de quem chegar primeiro e fazer o que bem entender?
Provavelmente, se questionados sobre essas barbaridades, os guardiões do Decreto-Lei 25/37 vão dizer que “o IPHAN não tem nada com isso”. Este é o ponto importante da questão. Nós, cidadãos, pagamos os impostos para manter uma estrutura administrativa regida por legislação do tempo da ditadura Vargas, sabendo-se que, dependendo das pessoas, trata-se de uma legislação de letras mortas porque vimos uma boa parte da cidade ser destruída, propositalmente destruída, e não aconteceu nada com os destruidores; ou pode ser também um receituário de punições acomodativas que sempre oneram os proprietários honorários advocatícios para se defender de ameaças gratuitas e servem sobremaneira para justificar que os zelosos funcionários estão trabalhando. Diante disso não mantenha o anacronismo de um serviço público que deveria estar fazendo coisas, e um bom começo seria a revisão do tombamento do patrimônio histórico da região, de modo que pudéssemos, pelo menos, acreditar no pertinente ato jurídico.
“O IPHAN não tem nada com isso” é uma frase que me faz lembrar uma passagem do meu tempo de rapazinho. Estava no largo do Carmo conversando com amigos quando dois pinguços começaram uma luta corporal na entrada da zona, que ainda não era a Zona Chic. Dirigimo-nos ao guarda-noturno ( que na época andava fardado e tinha algum poder de polícia) e indagamos: -Você não vai separar a briga? E o guarda, muito senhor de si, disse:
-“Não está no meu setor.”
Recebeu o meu amigo um ofício cheio de siglas e números; como diria O Sargento Getúlio, um monarquismo de documento: GAB/13ª CR/IPHAN-MG/Nº 534/97, dizendo que ele é possuidor de imóvel tombado pelo Poder Púbico Federal e considerando isso mais aquilo, está notificado para que no prazo de 15 dias deverá fazer um serviço emergencial do escoramento e apresentar, no prazo de 60 dias, projeto de restauração total do imóvel. E termina com a ameaça: “O não atendimento a esta NOTIFICAÇÃO acarretará medidas judiciais cabíveis, o que ensejará maiores ônus. Cordialmente, Maria Machado Rangel – Coordenadora Regional Substituta da 13ª CR/IPHAN.”.
A impressão dada pelo documento é semelhante à de estarmos em Londres, Berlim, Paris ou Viena, um pouquinho mais adiantados. Parece que moramos numa cidade onde todos os problemas do chamado Patrimônio Histórico estão resolvidos e que agora alguns cidadãos relapsos têm que ser ameaçados a fim de que seus imóveis sejam restaurados de modo quase integrem na “harmoniosa” paisagem arquitetônica da cidade. É neste ponto que não entendemos a questão. Por que fazer tais exigências diante das lastimáveis situações em que se encontram alguns monumentos, alguns próprios públicos e outras peças históricas como as obras raras da Biblioteca Batista Caetano de Almeida? Que força moral tem algum órgão público para exigir providências individualizadas dessa natureza quando a situação do tombamento dos imóveis históricos desta cidade é algo que merece uma investigação séria, por um lado, e um ajuste definitivo, por outro lado. Digo isso porque tenho em mãos uma certidão emitida pela Secretaria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional a qual gera dúvidas muito sérias sobre o ato jurídico do tombamento ocorrido em de São João del-Rei e, sendo assim, como vamos acreditar num órgão cujo trabalho está embassado num ato jurídico suspeito? Em primeiro lugar os imóveis estão inscritos no livro de Belas Artes e não no livro de Tombo Histórico, conforme preceitua o Inciso 2º do Artigo 4º do próprio Decreto-Lei 25/37. Em segundo lugar, como vamos acreditar num tombamento ocorrido em 1938, baseado numa planta da cidade de 1944? É bom ainda prestar atenção que o documento cita a praça Frei Orlando e, como todos sabem, Frei Orlando virou nome de praça em 26 de dezembro de 1945, conforme noticia o são-joanense Sebastião de Oliveira Cintra, um historiador digno de inteira confiança. (Galeria das Personalidade Notáveis de São João del-rei, p.232).
Estamos pois diante de uma verdadeira mágica: o tombamento do patrimônio arquitetônico de São João del-Rei foi feito de ofício, englobando patrimônios públicos e privados, em 1938, tendo por base fatos futuros de 1944 e 1945.
Voltando ao caso do meu amigo, de imediato, descarto a possibilidade de uma maldosa e deliberada perseguição pessoal que não faz sentido nestes amenos e lisos tempos de liberdade democrática. Os zelosos funcionários do IPHAN, na ausência de novidades importantes, devem estar simplesmente cumprindo os mandamentos do Decreto-Lei nº25/37, um dispositivo legal do tempo do Estado Novo que facilmente coloca o proprietário particular em situações constrangedoras, o que nos faz interrogar.
-Onde estavam os funcionários guardiões desse decreto quando destruíram a Avenida Rui Barbosa, a Rua Direita, a Rua do Comércio, a Rua Municipal? É bem verdade que os prédios destruídos foram substituídos por obras muito bem escoradas no concreto armado, projetadas e aceitas por pessoas cujos cérebros deveriam ser constituídos de massa cinzenta de puro cimento. Onde estavam os funcionários quando destruíram a igreja do Senhor Bom Jesus de Matosinhos? E vai por aí afora. E neste momento, será que os atuais zelosos guardiões do decreto-lei estão atentos à destruição do Chafariz da Legalidade? (Tardiamente estão lá, fazendo alguma coisa, e espero que não seja uma cerca de galinheiro como a que prendeu o Dr. Augusto Viegas por muitos anos). Estarão atentos às telhas de amianto na casa do Barão de Itambé e numa construção modernosa na praça da matriz de Resende Costa? E agora, que dizer das feias barracas dos camelôs? Que dizer de outras horrendas barracas que já têm até alicerce, que não só atravancam o caminhar dos transeuntes, bem como e sobretudo, são um péssimo e agressivo fator de poluição visual numa cidade da qual se diz ser possuidora de potencial turístico? Será que o projeto do governo federal já está contemplando a privatização das ruas e praças, na base de quem chegar primeiro e fazer o que bem entender?
Provavelmente, se questionados sobre essas barbaridades, os guardiões do Decreto-Lei 25/37 vão dizer que “o IPHAN não tem nada com isso”. Este é o ponto importante da questão. Nós, cidadãos, pagamos os impostos para manter uma estrutura administrativa regida por legislação do tempo da ditadura Vargas, sabendo-se que, dependendo das pessoas, trata-se de uma legislação de letras mortas porque vimos uma boa parte da cidade ser destruída, propositalmente destruída, e não aconteceu nada com os destruidores; ou pode ser também um receituário de punições acomodativas que sempre oneram os proprietários honorários advocatícios para se defender de ameaças gratuitas e servem sobremaneira para justificar que os zelosos funcionários estão trabalhando. Diante disso não mantenha o anacronismo de um serviço público que deveria estar fazendo coisas, e um bom começo seria a revisão do tombamento do patrimônio histórico da região, de modo que pudéssemos, pelo menos, acreditar no pertinente ato jurídico.
“O IPHAN não tem nada com isso” é uma frase que me faz lembrar uma passagem do meu tempo de rapazinho. Estava no largo do Carmo conversando com amigos quando dois pinguços começaram uma luta corporal na entrada da zona, que ainda não era a Zona Chic. Dirigimo-nos ao guarda-noturno ( que na época andava fardado e tinha algum poder de polícia) e indagamos: -Você não vai separar a briga? E o guarda, muito senhor de si, disse:
-“Não está no meu setor.”