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Mercado . Jota Dangelo
Descrição
Tenho fascinação pelos mercados. Não sei exatamente por que razão, o fato é que o mercado tem alguma coisa de rural, mesmo que se situe no centro do perímetro urbano. Talvez ele seja apenas um estímulo que me faz voltar à infância, quando via as verdureiras carregando seus produtos nas cestas que pendiam de cangalhas suportadas pelos ombros e oferecendo as mercadorias de casa em casa no centro histórico. Nunca fui de roças e sítios, muito menos de fazendas e plantações. Sou caracteristicamente urbano, citadino. Tenho trauma de pasto. Criança, era levado a Itaúna por minhas tias para visitar outras tias que moravam por lá. Eram fazendeiras. Certa vez os micuins me atacaram: os malditos carrapatos minúsculos me transformaram o corpo numa chaga. Pedi que nunca mais me levassem a Itaúna e fui atendido. Mas o mercado exerce sobre mim uma atração estranha e inusitada: parece que ali respiro um ar mais saudável e há uma atmosfera fraterna no ambiente.
Não sou muito dado a supermercados e seus aparatos, embora seja difícil libertar-se deles. Encanta-me, entretanto, muito mais, a simplicidade dos mercados com suas bancas toscas, mas cobertas de verduras fresquinhas, frutas atraentes e preços convidativos. Gosto de pensar, quando estou nos mercados, que os que me vendem foram os mesmos que plantaram e cuidaram daquelas folhas, tomates, cebolas, mandiocas, batatas, abóboras, pepinos, ainda que nem sempre esta seja a verdade. Em Belo Horizonte, o mercado é um ponto turístico, tal como o mercado de Salvador. Em Belô, em cada uma de suas entradas, o mercado exibe um balcão onde é possível saborear uma cerveja geladíssima, um aperitivo de qualidade e um fígado bovino passado na chapa, de gosto incomparável, marca registrada daquele estabelecimento. Nos idos de 50, era nos balcões do mercado central de Belo Horizonte que, aos sábados, era possível encontrar o compositor Rômulo Paes saboreando uma gelada e cantarolando um samba, quase sempre o famoso “Ah! Minha vida é esta: descer Bahia, subir Floresta!” Pena que coisa parecida com aqueles “bares-em-pé” não exista aqui, no nosso mercado municipal, onde costumo passar às sextas para comprar a mussarela em bolas (e é sempre preciso reservar com antecedência), às quintas para adquirir o falso lombo, às terças para me abastecer de verduras cultivadas sem agrotóxicos. Sou de um tempo em que o mercado era a única possibilidade de verduras e frutas na cidade. Arroz, feijão, grãos, açúcar, fubá, farinhas diversas só eram encontrados nos armazéns, com os produtos pesados em balanças primitivas e as compras anotadas em “cadernos” para pagamento no final do mês. Mas ainda existem mercados, para meu regalo. E gosto do nosso, embora instalado num prédio de mau gosto arquitetônico. Quem é freguês do mercado há de concordar comigo.
Fonte: Gazeta de São João del-Rei . 16/06/2012