Melhores Práticas
Preservação de acervos digitais local global
Descrição
Rede Brasileira de Serviços de Preservação Digital - CARINIANA
"Bibliografia sobre preservação digital: um levantamento nos diversos suportes informacionais"Evento de lançamento
Coleção Preservação Digital
Biblioteconomia & Ciência da Informação
Autores
Miguel Angel Márdero Arellano (Org.)Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia
https://orcid.org/0000-0001-5306-919XGildenir Carolino Santos (Org.)Universidade Estadual de Campinas http://orcid.org/0000-0002-4375-6815DOI: https://doi.org/10.20396/ISBN9786588816110
Palavras-chave:
Preservação digital - Bibliografia, Curadoria digital - Bibliografia
Sinopse
Esta obra organizada pelos membros do Grupo de Pesquisa "Estudos e Práticas de Preservação Digital" da Rede Cariniana traz à tona, por meio de uma variada coletânea a partir deste volume 1, uma compilação do estado da arte sobre Preservação Digital, arrolada no periodo de 30 anos, no Brasil e no mundo, organizado por vinte e uma (21) áreas temáticas dentro da área central sobre preservação digital, e estruturda pela compilagem de referências e bibliografias nos diversos suportes informacionais (livros, periódicos, sites, CD-ROM, etc.), aprimorando-se como uma fonte de referência para novos e futuros levantamentos bibliográficos a existir sobre o assunto.
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Biografia do Autor
Miguel Angel Márdero Arellano (Org.), Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e TecnologiaDoutor em Ciência da Informação pela Universidade de Brasília. Tecnologista Sênior do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia. Coordenador da Rede Brasileira de Preservação Digital - Cariniana. Gildenir Carolino Santos (Org.), Universidade Estadual de CampinasDoutor em Educação pela Universidade Estadual de Campinas. Pós-Doutorado em Divulgação Científica pela Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo da Universidade Estadual de Campinas. Bibliotecário responsável pelo Portal de Periódicos Eletrônicos Científicos da Universidade Estadual de Campinas.
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Entrevista:
“Ignorar o passado impede projetar o futuro. Sem preservar a memória digital nos arquivos, caminhamos para uma sociedade à deriva.”: Entrevista a Rafael António, Consultor de Sistemas de Informação no domínio dos arquivos e bibliotecas e museus.
(Archivoz) Como é que nasceu o seu interesse pelo mundo da informática e, como é que a partir deste, chegou ao da documentação e informação?
(Rafael António) O meu interesse decorreu do percurso académico original, em engenharia de eletricidade e máquinas, e da oportunidade de continuar o mesmo através da frequência da primeira licenciatura em engenharia informática criada em Portugal, pela Universidade Nova de Lisboa. Estávamos no limiar de grandes mudanças tecnológicas passando dos “mainframes” para os microprocessadores que permitiram banalizar a computação pessoal.
(Archivoz) Fale-nos um pouco do seu extraordinário percurso académico e profissional, e quais as funções que desempenhou, em que, neste último, não posso deixar de destacar ter dirigido o Centro de Documentação e Informação dos CTT, o “Centro de Sistemas Abertos” da UNISYS e o Sistemas de Informação e do Gabinete de Telecomunicações da GDP – Gás de Portugal, para além de ter sido professor convidado no Mestrado em Ciências da Documentação e Informação, da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, e colaborado com a Universidade de Coimbra e a Universidade Portucalense, a que acresceu a sua experiência como formador na BAD – Associação Portuguesa de Bibliotecários, Arquivistas e Documentalistas.
(Rafael António) Foi uma sequência feliz ser convidado para gerir o Centro de Documentação e Informação dos CTT que tinha uma biblioteca central e 13 bibliotecas descentralizadas. Sem uma formação especifica nesta área concentrei-me em introduzir novas tecnologias para a gestão da informação. Depois, surgiu o convite do Diretor da Biblioteca Nacional para o projeto de informatização que deu origem à PORBASE. Aqui, tive o privilégio de aprender com alguns dos melhores profissionais de biblioteca e arquivo entre eles a Dr.ª Fernanda Campos e a Dr.ª Madalena Garcia. O conhecimento que obtive foi muito importante na minha atividade de docente e formador tentando transmitir os princípios do que agora se denomina por transição digital.
(Archivoz) Colaborou em projetos de Sistemas de Informação no âmbito das bibliotecas e arquivos, pioneiros e estruturantes em Portugal, desde os anos 80, em que se destacam o início da informatização da Biblioteca Nacional, que levou à criação da Base Nacional de Dados Bibliográficos – PORBASE, e na implementação do TTOnline do Instituto dos Arquivos Nacionais/Torre do Tombo. O que nos pode dizer do impacto destes projetos de informatização nas bibliotecas e arquivos portugueses?
(Rafael António) Anteriormente existiram iniciativas dispersas de aplicação das tecnologias de informação às bibliotecas e arquivos. O que se pretendeu com a PORBASE foi constituir um catálogo coletivo das bibliotecas nacionais através de uma rede de comunicações interligando as universidades e as principais bibliotecas do país. De salientar que a internet ainda não estava disponível pelo que esta rede era limitada pelas tecnologias existentes.
O maior impacto nas bibliotecas terá sido a adoção de um formato normalizado de catalogação – UNIMARC, e o despertar para a importância da criação de catálogos respeitando esta norma.
O TTOnline foi a primeira experiência de disponibilização de imagens dos documentos do arquivo, mas que julgo não teve o impacto que era pretendido. De qualquer forma serviu como experiência de adoção de tecnologias de digitalização de microfilmes em larga escala e de descrição segundo as ISAD(G).
(Archivoz) De igual modo, esta indelevelmente ligado ao desenvolvimento de diversas aplicações para a gestão de bibliotecas e arquivos, como sejam o PORBASE, ARQBASE e DOCBASE, sendo coautor da base de dados jurídica LEXBASE (1989), da DOCBASE – aplicação de gestão integrada de bibliotecas (1990-2000), base de dados LISI – imagens de Lisboa (1991), MUSA para descrição de peças museológicas (1991) e ARCO para gestão de arquivos correntes (1993). O que nos pode destacar sobre a importância destas aplicações?
(Rafael António) Foi um tempo de descoberta da microinformática (termo usado na altura) pelas bibliotecas e arquivos através da disponibilização do programa Mini micro CDS/ISIS, da UNESCO. Antes mesmo da banalização do software livre este programa foi percursor do conceito sendo distribuído gratuitamente a centenas de entidades que utilizaram as versões originais da PORBASE e ARQBASE. Depois houve uma alteração destes princípios e surgiram aplicações comerciais que utilizavam o Mini-micro CDS/ISiS. O uso deste programa com as diferentes parametrizações que conhecemos contribuiu decisivamente para a literacia digital dos profissionais das bibliotecas e arquivos, muitos dos quais apenas tinham acesso a um computador pessoal e com ele fizeram maravilhas.
(Archivoz) Atualmente é consultor de Sistemas de Informação no domínio das Bibliotecas e Arquivos tendo vindo a atuar no estabelecimento de Sistemas de Gestão Documental, sendo ainda Presidente da Mesa da Assembleia da ANSOL (Associação Nacional para o Software Livre). No seu entender, qual a importância do software livre como alternativa para os arquivos e para os profissionais da informação, face a aplicações de gestão da informação disponibilizadas por empresas informáticas com produtos proprietários, em geral, e do ICA-AtoM (Conselho Internacional de Arquivos – Acesso à Memória), ATOM (Access to Memory) e do KOHA, programas de código aberto desenvolvidos em ambiente web, em particular?
(Rafael António) Passados cerca de 20 anos desde que tentei influenciar a comunidade de Arquivos e Bibliotecas para o uso destas aplicações sinto alguma frustração quanto aos objetivos que propunha. As aplicações de código aberto têm a grande vantagem de disponibilizar o acesso ao código dos programas e aos dados, tornando transparente a informação processada. Mas isto implica a disponibilidade de técnicos de informática para instalar os programas e dos arquivistas e bibliotecários para a sua parametrização e administração.
O que se tem constatado é que as instituições, com recursos informáticos escassos, recorrem a empresas externas para a implementação destes projetos não envolvendo os seus profissionais de arquivo e biblioteca, tal como se fosse uma aquisição de produtos proprietários. A endogeneização do conhecimento e autonomia na gestão das aplicações perde-se completamente tornando-os em meros utilizadores e digitadores da dados.
Perde-se assim o principio natural do software livre quanto à “ liberdade para usar, estudar, compartilhar…”
(Archivoz) É autor e/ou coautor de uma bibliografia marcante. Fazendo uma retrospetiva dos trabalhos publicados, quais são os que gostaria de destacar e as razões dessa escolha?
(Rafael António) Recordo a publicação do “Caderno de encargos do concurso público para adjudicação de sistema informático para a Biblioteca Nacional” em coautoria com Maria Luísa Cabral, com quem aprendi muito dos princípios de elaboração de trabalhos científicos.
Das mais recentes destaco uma publicação de autor, pouco divulgada, mas disponível em linha na APDSI (https://apdsi.pt/wp-content/uploads/prev/Moreq2010.pdf), que tentou sensibilizar a comunidade para a importância da aplicação do MOREQ2010, intitulada “A Gestão Documental na perspetiva do MOREQ2010” e, claro, os “Desafios Profissionais da Gestão Documental”
(Archivoz) Na sequência da questão anterior, a sua dissertação de mestrado, em Ciências da Documentação e Informação, publicada em 2009 pelas Edições Colibri e a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, com o título Desafios Profissionais da Gestão Documental, foi distinguida pela Associação Portuguesa de Bibliotecários, Arquivistas e Documentalistas com o Prémio Raul Proença 2008. Qual o significado da atribuição deste importante reconhecimento e das principais conclusões deste notável trabalho?
(Rafael António) Tenho de agradecer à BAD a existência do Prémio Raul Proença e ter sido escolhido para receber este prémio. A dissertação de mestrado foi um desafio importante por entender que enquanto docente convidado deveria sujeitar-me a provas académicas tendo sido a primeira dissertação a ser defendida, após a criação do mestrado em Ciências da Documentação e Informação. Devo também referir o meu orientador, Professor Aires do Nascimento e a arguente Professora Fernanda Ribeira, referências académicas nos arquivos que me deram esse privilégio.
Tratou-se de uma reflexão sobre a relação entre a gestão documental e os arquivos definitivos numa perspetiva integrada, que poderá servir aos novos profissionais como mais um contributo.
(Archivoz) O novo coronavírus (SARS-CoV 2) e a COVID-19 colocaram novos desafios aos arquivos, obrigando os seus responsáveis e colaboradores a adaptar-se a novas metodologias e formas de trabalhar. Fazendo um balanço desta nova realidade, que se fez sentir desde meados de março de 2020, pensa que os serviços de informação em Portugal foram capazes de se reinventar e dar uma resposta eficaz aos problemas e oportunidades surgidas?
(Rafael António) Conforme referi anteriormente sem uma participação ativa na implementação dos sistemas de informação em que se destacam novas metodologias e formas de trabalhar será difícil a endogeneização do conhecimento e autonomia na gestão das aplicações, tornando-os em meros utilizadores da informação. Adaptando à atualidade uma afirmação de Rabelais, escritor do sec. XVI, podemos afirmar que as tecnologias podem mesmo constituir “pedras mortas” com que alguns pretendem edificar o mundo, esquecendo que o fundamental são as “pedras vivas”, isto é, as pessoas
(Archivoz) Tendo em conta o seu notável e longo percurso no mundo da informação, quais é que considera que são os principais desafios e oportunidades dos profissionais da informação?
(Rafael António) Evitarei abordar um conceito tão genérico como o dos profissionais da informação, onde tanto cabem jornalistas como analistas de dados, além de muitos outros, para me centrar na tradição da terminologia anglo-saxónica abordando os desafios e oportunidades dos arquivistas e bibliotecários.
As organizações, em particular a Administração Pública e Local, têm confundido os conceitos de Gestão Documental e Arquivo separando os mesmos. Afinal um documento de arquivo nasce naquilo que se denomina por expediente e terá um ciclo de vida que só um arquivista pode determinar. A falta de uma cultura dos dirigentes sobre esta visão integrada tem levado a que sejam implementadas aplicações de “registo de correspondência” que ignoram o modelo de requisitos expresso no MOREQ2010. Este é talvez o maior desafio dos profissionais de arquivo para valorizar o seu papel no seio das organizações, demonstrando a importância do ciclo de vida dos documentos. Na era digital esse papel é ainda mais importante quando o correio eletrónico compete com os documentos impressos e urge definir novos procedimentos.
No que respeita às bibliotecas continuamos a assistir a uma desvalorização da importância dos catálogos face aos motores de busca e à inteligência artificial. O aparecimento de repositórios diversos, meras colagens de metadados obtidos através da mineração de dados, pode levar a confundir estes com os catálogos das bibliotecas bem organizados, fundamentados em normas estabelecidas e apoiados em ficheiros de autoridade consistentes e uniformes. Não existe um ficheiro de autoridades nacional o que dificulta a troca de registos com cabeçalhos normalizados, lacuna que também se estende aos arquivos.
O grande desafio dos seus profissionais está precisamente a mudança para plataformas tecnológicas que ofereçam a mesma qualidade de serviço que as bibliotecas sempre ofereceram. Isto exige o seu envolvimento na administração dessas plataformas gerindo os recursos e ajustando as mesmas para formas inovadoras de comunicação com os leitores.
(Archivoz) Como perspetiva a tão propagada transição digital no nosso país, quando temos, por exemplo, a Administração Pública, salvo algumas exceções, sem serviços-online, isto é, não desmaterializada?
(Rafael António) A transição digital não depende apenas do uso de tecnologias nem fica condicionada pela ausência de desmaterialização.
A capacidade de gestão, os processos de trabalho e a endogeneização de competências digitais são os fatores essenciais para a mudança. Afinal andamos há muitos anos a falar sempre do mesmo, mudando apenas o léxico, sem que a mudança aconteça.
O que também me preocupa nesta transição digital é a falta de visão do seu impacto ao nível da segurança dos dados e dos sistemas e da preservação digital dos documentos. Os ciberataques são cada vez mais frequentes. A memória da sociedade será perdida se nada for feito para garantir a preservação digital dos arquivos. Corremos o risco, como disse João Lobo Antunes, de perder a memória e “…sermos navegadores sem bússola. É das maldições piores que existem.”
Fonte: Paulo Jorge dos Mártires Batista | Fev 21, 2022