Em 1991 encontrei no pequeno brechó de livros sobre teatro da EAD-ECA-USP, uma bela edição ilustrada que continha peças do irlandês William Butler Yeats. A doce descoberta me fez mergulhar no universo dramatúrgico e na poesia romântico-simbolista do Prêmio Nobel de 1923. Encantei-me especialmente com a peça chamada O País do Desejo do Coração, e acalentei por anos a ideia de produzi-la e monta-la em palcos brasileiros. O sonho se fez possível apenas agora, no ano de 2014, vinte e cinco anos depois. Prova definitiva, claro, do meu apreço pelo texto conciso e mítico de Yeats, e também de sua grandiosidade. As grandes obras, sabemos, atravessam inalteradas em sua força, os anos e as eras. Agora, aproveitando o surgimento valioso de uma mostra de teatro em Tiradentes, Minas Gerais, convidei o grupo local Entre&Vista para a empreitada. A peça aparentemente ingênua de Yeats tinha na voz e corpo dos atores tiradentinos, na minha opinião, sua 'perfeita tradução': Na casa de fazenda de uma família humilde, numa fria noite de maio, o elegante Padre Hart é recebido com honrarias. Maurteen e Bridget Bruin pedem ajuda ao venerando padre para aconselhar a jovem nora, Mary, esposa de seu filho Shawn, a aceitar sua nova condição de esposa e trabalhadora do campo. Nostálgica de seu passado abastado, e pressionada pelas tradições familiares e religiosas a tornar-se uma calma e prendada senhora, Mary explode em desespero, clamando às fadas e às forças da natureza por um destino de liberdade. Shawn, intervém, e acalma com afeto sua jovem mulher. Tudo parece calmo. Mas eis que surge do profundo da noite uma estranha menina. Num golpe trágico, Yeats nos surpeende, colocando em cheque as tradições protestantes de seu tempo e dando vitória trágica ao desejo e à arrebatadora força natural dos elementos. Madeira, amor, terra, mel, fé, leite, vinho, paixão, medo e tradição dançam ao redor da chama de Yeats. Atores sinceros, ligados desde a infância às tradições católicas mineiras descobrem o poder da poesia, da comédia e tragédia de um dos maiores autores de todos os tempos.
Acredito, sempre, na atuação como veículo sustentação da poesia trágica e do depoimento pessoal. Trabalhei com o grupo Entre&Vista no sentido de, claro, desvendar os arquétipos dos tipos de Yeats, seus velhos conhecidos das terras mineiras, e também de retirar das interpretações qualquer cacoete que afaste a sinceridade. Marcações teatralmente simples e fortes, elementos da natureza na cenografia, a sinceridade das atuações e a música ao vivo fazem dessa montagem de 'O País do Desejo do Coração', uma espécie de oração às avessas. Como deve. sempre, ser o Teatro que amo e almejo fazer.

Matheus Nachtergaele

Grupo Oficina de Teatro Entre & Vista

Fundada em 1992, por Eros Miguel Conceição, a OFICINA DE TEATRO ENTRE & VISTA  tem como finalidade: organizar e promover oficinas de formação de atores, tais como expressão corporal, linguagem, música (Grupo de Seresta e Poesia), dança e representação; difundir a cultura teatral, tornando-a mais acessível à comunidade; trabalhar visando o desenvolvimento, a participação e a conscientização da comunidade acerca de manifestações culturais diversas.
Já foram encenadas mais de 40 peças, fez perto de 150 apresentações, além de dezenas de saraus poéticos, serestas, cortejos, danças, recitais, circo-teatro, oficina. Busca a profissionalização da equipe, melhorar a qualidade das produções e aumentar o envolvimento da comunidade com a cultura regional.
Esta instituição foi criada para ser um forte ponto de apoio cultural para Tiradentes, São João del-Rei e região, onde se trabalha com atividades que visam, por um lado, recuperar seu passado cultural e, por outro, inovar com sustentabilidade e respeito ao patrimônio histórico e artístico. Ganhou prêmios por isso. E, por mérito, transformou-se em Ponto de Cultura.

Fonte e mais informações:
Assessoria de Comunicação da Prefeitura de São João del-Rei
(32) 3379-2915 - (32) 3379-2918