São João del Rei Transparente

Legislação

Compromisso de Brasília . Estudo da complementação das medidas necessárias à defesa do patrimônio histórico e artístico nacional

Corpo

Abril de 1970

1o Encontro dos Governadores de Estado, Secretários Estaduais da Área Cultural, Prefeitos de Municípios Interessados, Presidentes e Representantes de Instituições Culturais

Os Governadores de Estado presentes ao encontro promovido pelo Ministério da Educação e Cultura, para o estudo da complementação das medidas necessárias à defesa do patrimônio histórico e artístico nacional; os Secretários de Estado e demais representantes dos governadores que, para o mesmo efeito, os credenciaram; os prefeitos de municípios interessados; os presidente e representantes de instituições culturais igualmente convocadas, em união de propósito, solidários integralmente com a orientação traçada pelo Ministro Jarbas Passarinho, na exposição por sua excelência feita ao abrir-se a reunião, e manifestando todo o apoio à política de proteção aos monumentos, à cultura tradicional e à natureza, resumida no relatório apresentado pelo diretor do órgão superior, a Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (DPHAN), a quem incumbe executá-la, e nas recomendações que nele se contêm, do Conselho Federal de Cultura, decidiram consolidar, através de unânime aprovação, as resoluções adotadas no documento ora por todos subscrito e que se chamará Compromisso de Brasília.

Reconhecem a inadiável necessidade de ação supletiva dos Estados e dos Municípios à atuação federal no que se refere à proteção dos bens culturais de valor nacional;

Aos Estados e Municípios também compete, com a orientação técnica da DPHAN, a proteção dos bens culturais de valor regional;

Para a obtenção dos resultados em vista, serão criados onde ainda não houver, órgãos estaduais e municipais adequados, articulados devidamente com os Conselhos Estaduais de Cultura e com a DPHAN, para fins de uniformidade da legislação em vista, atendido o que dispõe o art. 23 do Decreto-Lei 25, de 1937;

No plano da proteção da natureza, recomenda-se a criação de serviços estaduais, em articulação com o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal e, bem assim, que os Estados e Municípios secundem o esforço pelo mesmo instituto empreendido para a implantação territorial definida dos parques nacionais;

De acordo com a disposição legal acima citada, colaborará a DPHAN com os Estados e Municípios que ainda não tiverem legislação específica, fornecendo-lhes as diretrizes tendentes à desejada uniformidade;

Impõe-se complementar os recursos orçamentários normais com o apelo a novas fontes de receita de valor real;

Para remediar a carência de mão-de-obra especializada, nos níveis superiores, médio e artesanal, é indispensável criar cursos visando à formação de arquitetos restauradores, conservadores de pintura, escultura e documentos, arquivologistas e museólogos de diferentes especialidades, orientados pelo DPHAN e pelo Arquivo Nacional os cursos de nível superior;

Não só a União, mas também os Estados e municípios se dispõem a manter os demais cursos, devidamente estruturados, segundo a orientação geral da DPHAN, atendidas as peculiaridades regionais;

Sendo o culto ao passado elemento básico da formação da consciência nacional, deverão ser incluídas nos currículos escolares, de nível primário, médio e superior, matérias que versem o conhecimento e a preservação do acervo histórico e artístico, das jazidas arqueológicas e pré-históricas, das riquezas naturais, e da cultura popular, adotado o seguinte critério: no nível elementar, noções que estimulem a atenção para os monumentos representativos da tradição nacional; no nível médio, através da disciplina de Educação Moral e Cívica; no nível superior (a exemplo do que já existe no cursos de Arquitetura com a disciplina de Arquitetura no Brasil, a introdução, no currículo das escolas de Arte, de disciplina de História da Arte no Brasil; e nos cursos não especializados, a de Estudos Brasileiros, parte destes consagrados aos bens culturais ligados à tradição nacional;

Caberá às universidades o entrosamente com bibliotecas e arquivos públicos nacionais, estaduais, municipais, bem assim os arquivos eclesiásticos e de instituições de alta cultura, no sentido de incentivar a pesquisa quanto à melhor elucidação do passado e à avaliação de inventários dos bens regionais cuja defesa se propugna;

Recomenda-se a defesa do acervo arquivístico, de modo a ser evitada a destruição de documentos, ou tendo por fim preservá-los convenientemente, para cujo efeito será apreciável a colaboração do Arquivo Nacional com as congêneres repartições estaduais e municipais;

Recomenda-se a instituição de museus regionais, que documentem a formação histórica, tendo em vista a educação cívica e o respeito da tradição;

Recomenda-se a conservação do acervo bibliográfico, observadas as normas técnicas oferecidas pelos órgãos federais especializados na defesa, instrumentação e valorização desse patrimônio;

Recomenda-se a preservação do patrimônio paisagístico e arqueológico dos terrenos de Marinha, sugerindo-se oportuna legislação que subordine as concessões nessas áreas à audiência prévia dos órgãos incumbidos da defesa dos bens históricos e artísticos;

Com o mesmo objetivo, é de desejar que nos Estados seja confiada a especialistas a elaboração de monografias acerca dos aspectos sócio-econômicos regionais e valores compreendidos no respectivo patrimônio histórico e artístico; e também que, em cursos especiais para professores do ensino fundamental e médio, se lhes propicie a conveniente informação sobre tais problemas, de maneira a habilitá-los a transmitir às novas gerações a consciência e interesse do ambiente histórico-cultural;

Caberá às secretarias competentes dos Estados a promoção e divulgação do acervo dos bens culturais da respectiva área, utilizando-se, para este fim, os vários meios de comunicação de massas, tais como a imprensa escrita e falada, o cinema, a televisão;

Há, outrossim, necessidade premente do entrosamento com a hierarquia eclesiástica e superiores de ordens religiosas e confrarias, para que todas as obras que se venham a efetuar em imóveis de valor histórico ou artístico de sua posse, guarda ou serventia, sejam precedidas da audiência dos órgãos responsáveis pela proteção dos monumentos, nas diversas regiões do país;

Que a mesma cautela prevista no item anterior seja tomada junto às autoridades militares, em relação aos antigos fortes, instalações e equipamentos castrenses, para a sua conveniente preservação;

Urge legislação defensiva dos antigos cemitérios e especialmente dos túmulos históricos e artísticos e monumentos funerários;

Recomenda-se utilização preferencial para casas de cultura ou repartições de atividades culturais, dos imóveis de valor histórico e artístico cuja proteção incumbe ao poder público;

Recomenda-se aos poderes públicos estaduais e municipais colaboração com a DPHAN, no sentido de efetivar-se o controle do comércio de obras de arte antiga;

Os participantes do Encontro ouviram com muito agrado a manifestação do Ministro de Estado, sensível à conveniência da criação do Ministério da Cultura, e consideram chegada esta oportunidade, tendo em vista a crescente complexidade e o vulto das atividades culturais no país;

O Conselho Federal de Cultura e os Conselhos Estaduais de Cultura opinarão sobre as demais propostas apresentadas à conferência, conforme o seu caráter, para o efeito de as encaminhar oportunamente à autoridade competente.

E por terem assim deliberado, considerando os superiores interesses da cultura nacional, assinam este compromisso.

Brasília, 3 de abril de 1970

O Compromisso foi assinado pelo Ministro Jarbas Passarinho, da Educação e Cultura, Governadores de Estado presentes à reunião por s. Ex.a. convocada, Secretários de Estado, Diretores dos Departamentos de Cultura, Diretores dos Conselhos Estaduais de Defesa do Patrimônio Histórico, pelos Presidentes do Conselho Federal de Cultura, prof. Artur César Ferreira Reis, do Patrimônio Histórico Nacional, prof. Renato Soeiro, Presidente do Instituto Histórico Brasileiro, prof. Pedro Calmon, e delegados de outras entidades culturais do país representadas no conclave.

Pelo Estado de Santa Catarina assinaram o documento os professores Valdir Bhering Faustino da Silva, Secretário de Estado da Educação e Cultura, Carlos Humberto Pederneiras Corrae, Diretor do Departamento de Cultura, e Oswaldo Rodrigues Cabral, representante da Universidade Federal de Santa Catarina e da comissão especial que estuda a organização do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico do Estado nomeada pelo Governador Ivo Silveira.

Anexo:

O problema da recuperação e restauração de monumentos, trate-se de uma casa seiscentista como estas de São Paulo, ou das ruínas desta igreja de São Miguel, no Rio Grande do Sul, é extremamente complexo.

Primeiro, porque depende de técnicos qualificados cuja formação é demorada e difícil, pois requer, além do tirocínio de obras e de familiaridade com os processos construtivos antigos, sensibilidade artística, conhecimentos históricos, acuidade investigadora, capacidade de organização, iniciativa e comando e, ainda, finalmente, desprendimento.

Segundo, porque implica em providências igualmente demoradas, como o inventário histórico-artístico do que exista na região, o estudo da documentação recolhida, o tombamento daquilo que deve ser preservado, a eleição do que mereça restauro prioritário, a apropriação de verbas para esse fim, a escolha de técnicos, o estudo preliminar na base de investigação histórica e das pesquisas in loco, a documentação e o registro das fases da obra e, por fim, a manutenção e o destino do bem recuperado.

Apesar da deficiência dos meios, a Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - obra da vida de Rodrigo M.F. de Andrade - tem procedido ao restauro de monumentos - talha, pintura, arquitetura - em todo o país; mas no acervo de cada região há obras significativas e valiosas cuja preservação escapa à alçada federal; é, pois, chegado o momento de cada Estado criar o seu próprio serviço de proteção vinculado à universidade local, às municipalidades e à D.P.H.A.N., para que assim participe diretamente da obra penosa e benemérita de preservar os últimos testemunhos desse passado que é a raiz do que somos - e seremos.

Lucio Costa, 1970

Fonte: IPHAN

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