São João del-Rei, Tiradentes e Ouro Preto Transparentes

a cidade com que sonhamos é a cidade que podemos construir

la ciudad que soñamos es la ciudad que podemos construir

the city we dream of is the one we can build ourselves

la cittá che sognamo é la cittá che possiamo costruire

la ville dont on rêve c’est celle que nous pouvons construire

ser nobre é ter identidade
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Publicações

Tipo: Artigos | Cartilhas | Livros | Teses e Monografias | Pesquisas | Lideranças e Mecenas | Diversos

Escopo: São João del-Rei | Tiradentes | Ouro Preto | Minas Gerais | Brasil | Mundo

 

São João del-Rei . Sirva-se do passado e do presente . Jota Dangelo

Descrição

Aqui é d´El-Rey. E há que andar por estas ruas e descobrir belezas insuspeitadas. Há que se surpreender em cada esquina entre o colonial e o eclético, entre o barroco e o neoclássico. Há que se ver mais do que com olhos, enxergar com o coração, ampla retina que açambarca séculos e transborda espanto e susto.

Aqui é d´El-Rey, com apóstrofe e hipsilo, de D. João e Thomé Portes, do garimpeiro João Barcelos faiscando ouro no Arraial Novo e da crônica pioneira de José Mattol, escrita nas primeiras décadas dos setecentos.

Aqui é d´El-Rey, Comarca do Rio das Mortes, nascido no Vale do Lenheiro, entre as Betas auríferas do alto das Mercês e o Morro da Forca, ironicamente chamado do Bonfim. Entre o contraforte rochoso, de um lado, e os morrotes, do outro, d´El-Rey espraia-se às margens do córrego que a atravessa, tímido regato que se avoluma revoltoso e irado nas cheias e preenche o vão de cais a cais. Os antigos sabiam dos mistérios deste riacho surpreendente por isso as pontes monumentais que o transpõem, do Rosário e da Cadeia, com arcarias esporões de pedra, pronto a resistirem a impetuosidade das águas.

E porque é vale é montanha, os arredores da cidade estimulam passeios ecológicos e o encanto das cachoeiras compensa a aspereza das caminhadas. Vale a pena explorar a cercania para encontrar a natureza em festa. Pois tudo é festa para quem nasceu em meio a rituais barrocos.

Aqui é d´El-Rey. Tudo é um convite aos olhos e à emoção, como quem chega de longe e a água quente o espera para o banho reconfortante, a mesa posta, a palavra amiga.

Não basta se encantar com os templos, portadas magníficas como as do Carmo e São Francisco, simplicidade retilínea no Rosário, Catedral do Pilar e Mercês. Não basta louvar entalhadores e mestres do pincel que fizeram das naves e capelas-mor o umbral de um paraíso imaginário. Nem admirar-se da douração profusa dos altares ou das volutas e concheados nas quais se retorce a madeira bruta de púlpitos ornados com dosséis.

É preciso também ouvir a sinfonia de bronze destes sinos, e dobre festivo ou fúnebre, único no país, que desperta, avisa, alerta, anuncia, dialoga com a população em sons, repiques e “terentenas”.

Aqui é d´El-Rey, ritualística e musical. Por esta razão, é preciso ouvir os acordes de orquestras bicentenárias, como a Ribeiro Bastos e a Lira Sanjoanense, em Te Deum , novenas, motetos e matinas.

Não basta caminhar por praças tranqüilas como a do Carmo, do Largo da Cruz, da Câmara, a do Chafariz da Legalidade, ou imponentes como a de São Francisco com suas palmeiras imperiais.

É preciso também enveredar por confins do centro histórico e descobrir vielas pitorescas, o Beco do cotovelo, o conjunto eclético da Rua Santo Elias, a aparência de presépio do casario da Rua Santo Antônio, o Beco da Escadinha nas proximidades da Igreja do Carmo. Há que visitar museus e reencontrar o passado, sobretudo o de Arte Sacra, o Regional e o Ferroviário. É absolutamente necessário sobrar algum tempo para voltar a ser criança e viajar na Maria Fumaça até Tiradentes, outra jóia à sua espera.

Aqui é d´El-Rey. Há tesouros arquitetônicos perdidos nas ruas transversais, lojas de incríveis quinquilharias e antiguidades, tão pequenas como alcovas, tão ocultas como pepitas no cascalho. Há que saber descobrir sabores da terra, bolinhos de feijão, licores e doces caseiros.

Há que apreciar o talento de seus artesãos, pintores, santeiros e fabricantes de móveis, bordadeiras e artistas do crochê, do crivo e da renda de bilro. Palmilhar o chão, como fizeram seus primeiros habitantes. E não se atenha apenas às fachadas austeras de beira-seveira, às sacadas de ferro rendilhado, às platibandas encimadas por jarretes e pontais como as que se exibem na Rua Direita, na Rua da Prata, na Rua do comércio e na Rua municipal. Não se acanhe em pedir permissão para invadir um destes espaços privados ou visitar os públicos: em muitos deles o século XIX mostra-se por inteiro, com portais de pinho de riga, forros de saia-e-camisa, pisos de tábuas largas, oratórios seculares e móveis de ancestrais familiares. Porque aqui é d´El-Rey.

Não lastime descaracterizações ou aberrações cromáticas de duvidoso gosto que, vez por outra, pertubam a harmonia de conjuntos. Aqui, como em toda parte, nem sempre o homem compreendeu bem o significado de processo. Mas sinta que no todo prevalece admirável composição de estilos, preciosidades coloniais e magníficos exemplares neo-clássicos e ecléticos como não se há de ver em nenhuma outra cidade do ciclo do ouro. Porque aqui é d´El Rey, dourada pelo sol do seu verão ou visão ancestral nas brumosas madrugadas do seu inverno. Esteja em casa. Sirva-se do passado e do presente e receba o abraço amigo do São-joanense.
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